Faculdade, trabalho, dona de casa e mãe solo - O Mundo Autista
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Faculdade, trabalho, dona de casa e mãe solo

Flor de Lótus azul, em close.

Olá, continuo neste espaço a compartilhar minhas vivências. Então, neste texto vou falar sobre minha vida como mãe solo e as mil e uma atividades: faculdade, trabalho, dona de casa, e mãe solo. Mas, antes, relembrando: desde dezembro, compartilho com vocês, na editoria Diversidade 50+, minha trajetória.

Foram tempos de muita dedicação, muito trabalho e muito aprendizado

Sou uma pessoa que necessita de uma boa noite de sono. Entretanto, nesse período, o início de meu dia era antes das seis horas. Assim, tomava um café corrido, corria para o trabalho. Então, até às 11h30, a Escola Municipal Padre Henrique Brandão era o meu palco de atuação. Tenho grandes alegrias registradas em minhas lembranças.

Eu, educadora. Para além da faculdade trabalho dona de casa e mãe solo

Meus alunos eram vindos das comunidades, com uma realidade de muita pobreza. Mas ver cada pessoinha desabrochar, buscando seu lugar ao sol, era uma trajetória prazerosa. Portanto, eu tive a oportunidade de crescer com elas, “encenando, de maneira lúdica, a programação dos conteúdos de ciências, moral cívica etc. Dessa forma, junto aos alunos, projetei um “pseudo” jornalzinho da escola. No quadro nomeamos redator, produtor, repórter, entre outros. Cada um, inclusive eu, tinha sua função. Foi fantástico aprender ensinando.

Dessa época, também trago algumas lembranças me entristecem. Por exemplo, não havia cursos nem políticas públicas que fortalecessem a convivência entre comunidade e escola. Além disso, os pais, nas suas variadas questões e ignorâncias, ao discordarem da escola, invadiam o espaço e ameaçavam a todos nós.

A pedagogia, a mãe solo e suas mil e uma atividades

Também é dessa época, a transição entre os métodos de ensino. Deixávamos para trás a rigidez de um ensino tradicional, com a palmatória e o castigo. Buscávamos o ensino que desse mais liberdade para cada aluno. Contudo, os pais entenderam que agora a escola era mais livre em tudo. Eles passaram a exigir atenção ilimitada para seu próprio filho. Qualquer evento, era motivo para eles brigarem com os professores.

Infelizmente, nesse contexto, eu me sentia levada a ter atitudes mais firmes com os pais, algumas vezes. Confesso que me arrependo de algumas delas. Mas, hoje sei, que elas tiveram o valor de me engajar no contexto de uma mudança benéfica. Certamente, ainda hoje, em processamento.

Dois turnos de trabalho – além da faculdade, dona de casa e mãe solo

Saía do trabalho às 17h30. Tomava dois ônibus para chegar à faculdade às 19 horas. Assim, é evidente que quase sempre eu me atrasava.

Já como dona de casa e mãe de família, adivinhem: a vida, também, era bem apertada. Eu e minhas três filhas morávamos de aluguel. Meu salário nunca dava para todas as despesas. No processo de separação havia sido designada uma pensão alimentícia. Meu ex-marido era militar. Então, o corporativismo entre os militares criava certas artimanhas. Resultado: Quase nunca eu recebia a pensão em dia.

Dessa forma, eu me desdobrava entre o emprego formal, de professora e, durante o fim de semana, prestava serviço em um salão de beleza. Afinal, precisava ter o dinheiro do leite e da condução para ir à faculdade.

Certamente, a faculdade foi um lugar de muita glória, Mas, também, foi ela que me levou a vivenciar o preconceito. Havia o distanciamento real entre as classes sociais. Desse modo, o fato de haver chegado à faculdade, saída de uma “favela”, me trouxe problemas no trabalho. Por mais que me esforçasse, a diretora sempre reclamava. Assim, exausta por uma carga pesada de três jornadas e sofrendo essa perseguição, pedi transferência para o setor administrativo, da procuradoria do Município.

Mais trabalho, dona de casa e… mãe solo

Também na procuradoria, setor dos advogados da PBH, havia discriminação. Todos acreditavam que a Procuradoria era um departamento nobre. E eu? Para eles, eu não tinha “berço”. Mesmo que fosse para trabalhar como funcionária administrativa.

Todavia, após alguns anos, a Prefeitura de BH, abriu edital para sete vagas para Procurador do Município. Seria um concurso interno para os funcionários do Município. Pensei: “É agora ou nunca.”

Pensei nas estratégias para estudar. Dessa maneira, solicitei férias prêmio, modalidade do serviço público. Parti para um horário rigoroso de estudo, em casa. Estudei o dia inteiro, por três meses. Não visitava ninguém, nem meus pais. Também não recebia visitas. Só parava para recitar o meu mantra budista “Nam myoho rengue kyo”. Recitava por duas horas diárias, antes de dormir. Mas valeu a pena. Foi assim que eu conquistei a vaga de Procuradora Municipal. Aliás, cargo no qual me aposentei, anos mais tarde.

Também entre os procuradores, enfrentei forte discriminação. Contudo, ergui os ombros, empinei o nariz e segui em frente. Aquele lugar era meu. Uma conquista duramente perseguida e almejada. Portanto, era ali que eu desempenharia minha função, com dedicação e gratidão. Gostassem meus colegas ou não.

As conquistas da ‘Mãe solo e suas mil e uma atividades’

Hoje, aposentada, conquistei o direito a uma velhice digna. Minhas filhas cursaram faculdades de direito, engenharia e comunicação social. E, assim, seguem a vida respeitadas como excelentes profissionais.

O melhor é que me sinto e sou muito amada e respeitada. Tanto no meu círculo social e no círculo profissional de todas as três filhas. Aliás, sou avó de quatro netas e de um neto. Todos formados em grau superior. E, uma neta, a primeira a se graduar como Mestre, em uma Universidade Pública.

Não posso deixar de frisar que minhas vitórias tiveram como marco, a minha prática religiosa. Pratico o budismo de Nichiren Daishonin. Em outras palavras, sou membro da organização não governamental Soka Gakkai Internacional. BSGI no Brasil. Meu mestre, o dr. Daisaku Ikeda, filósofo e pacifista, me orienta diariamente. Isso, por meio de seus livros, jornais e revistas. Experimento a felicidade absoluta. Certamente, comprovo no meu dia a dia, que NÃO HÁ ORAÇÃO SEM RESPOSTA. Sou imensamente grata ao Mestre, aos meus companheiros de prática da fé, à minha família e a todo o Universo!

Sempre trouxe em minha mente:

A lamentação apaga a boa sorte! Não podemos desistir pois, como diz o poeta, “gente é para brilhar”.

Irene em oração #SGI

Texto de Irene Maria da Silva

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.

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