O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição do neurodesenvolvimento que afeta a comunicação, a interação social e o comportamento. No entanto, é crucial reconhecer que a experiência de uma pessoa autista vai muito além desses aspectos centrais. A saúde mental é uma dimensão fundamental e que demanda atenção especializada, uma vez que indivíduos no espectro apresentam uma maior prevalência de condições de saúde mental em comparação com a população em geral. Entender que nem tudo é causado pelo autismo isoladamente.
Pessoas autistas enfrentam um conjunto único de desafios que podem impactar significativamente seu bem-estar emocional. Fatores como o isolamento social, as dificuldades na comunicação e a hipersensibilidade ou hipossensibilidade sensorial podem ser fontes constantes de estresse e ansiedade. A pressão para se conformar a padrões sociais neurotípicos e a falta de compreensão e aceitação por parte da sociedade também contribuem para o sofrimento psíquico. Além disso, a união entre invalidação alheia pode ser um verdadeiro ‘coquetel molotov’ para o autista.
Contudo, o sofrimento mental não precisa ser um fim em si mesmo. Afinal, o indivíduo pode usar suas lutas como um combustível para desenvolver empatia, aprofundar sua resiliência e inspirar outras pessoas. A depressão, por exemplo, pode se tornar a base para uma maior compaixão por aqueles que sofrem, e a ansiedade pode ser o catalisador para desenvolver uma inabalável paz interior.
Prevalência e Desafios Comuns envoilvendo Autismo e Saúde Mental
Estudos indicam que a comorbidade de transtornos psiquiátricos em pessoas com TEA é alta. Entre as condições mais comuns estão:
- Transtornos de Ansiedade: A ansiedade é uma das condições mais frequentemente associadas ao autismo. A dificuldade em prever situações sociais, a sobrecarga sensorial e a rigidez cognitiva podem gerar um estado de alerta constante e crises de ansiedade. A prevalência de transtorno de ansiedade em pessoas autistas é significativamente alta, variando de 11% a 84% em jovens e de 29% a 50% em adultos.
- Depressão: O isolamento social, o bullying e a dificuldade em expressar emoções podem levar a sentimentos de tristeza, desesperança e perda de interesse em atividades que antes eram prazerosas, configurando um quadro depressivo. essoas no espectro autista têm quatro vezes mais chances de ter depressão do que pessoas neurotípicas. Ao longo da vida, quase metade dos adultos autistas (aproximadamente 50%) podem desenvolver depressão. Estudos indicam que até 85% das pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) podem ter algum sinal da doença em algum momento da vida.
- Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH): A sobreposição de sintomas entre TEA e TDAH é comum, incluindo dificuldades de concentração, impulsividade e inquietação. A prevalência de TDAH em pessoas com autismo (TEA) é alta, variando de cerca de 30% a 50%, de acordo com vários estudos. Essa alta taxa de comorbidade pode complicar o diagnóstico e o tratamento, pois os sintomas podem se sobrepor e interferir uns nos outros. Em adolescentes, um estudo estimou que mais da metade das mulheres autistas (57,4%) e quase metade dos homens autistas (49,1%) também recebem diagnóstico de TDAH.
É importante estar atento a sinais de alerta como mudanças repentinas de humor, irritabilidade, comportamentos autodestrutivos, alterações no sono e no apetite, e perda de habilidades previamente adquiridas.
A Importância do Suporte Adequado para Autismo e Saúde Mental
Para promover a saúde mental de pessoas autistas, é essencial uma abordagem multidisciplinar e individualizada. O suporte pode incluir:
- Psicoterapia: Terapias podem ajudar a pessoa autista a desenvolver estratégias para lidar com a ansiedade, a depressão e os desafios sociais. É desejável que o profissional tenha experiência com o autismo. Para muitos, a Terapia Cognitivo Comportamento (TCC) é vista como a mais adequada.
- Terapia Ocupacional: Auxilia no desenvolvimento de habilidades para a vida diária e na regulação sensorial, ajudando a lidar com a sobrecarga de estímulos do ambiente.
- Fonoaudiologia: Aprimora as habilidades de comunicação, o que pode reduzir a frustração e a ansiedade em situações sociais.
- Intervenção medicamentosa: Em muitos casos, o uso de medicamentos pode ser necessário para tratar comorbidades como ansiedade, depressão ou TDAH, sempre sob a supervisão de um médico especialista.
Estratégias para o Bem-Estar Emocional
Além do suporte profissional, algumas estratégias podem ser implementadas no dia a dia para promover o bem-estar emocional de pessoas autistas:
- Ambiente Estruturado e Previsível: Rotinas claras e a antecipação de mudanças podem reduzir significativamente a ansiedade.
- Espaços de Descompressão: Ter um “cantinho da calma”, um local com poucos estímulos visuais e sonoros, pode ser útil para momentos de sobrecarga sensorial.
- Incentivo aos Interesses: Dedicar tempo às paixões e aos interesses específicos da pessoa autista é uma fonte importante de prazer e autorrealização.
- Validação Emocional: É crucial validar os sentimentos da pessoa autista, mesmo que a reação a uma determinada situação pareça desproporcional. Além disso, é importante olhar para o contexto, as relações com as pessoas em sua volta, em vez de considerar o autismo como a única fonte de dor e sofrimento. Também é importante observar as questões sensoriais e motoras, e os problemas de saúde física que se interseccionam com aspectos mentais.
Cuidar da saúde mental de pessoas autistas é um passo fundamental para garantir sua qualidade de vida, autonomia e felicidade. Ao oferecer o suporte adequado e promover um ambiente de aceitação e compreensão, contribuímos para que possam desenvolver todo o seu potencial e viver de forma plena e saudável.

Sophia Mendonça é jornalista, professora universitária e escritora. Além disso, é mestre em Comunicação, Territorialidades e Vulnerabilidades (UFMG) e doutoranda em Literatura, Cultura e Tradução (UfPel). Ela também ministrou aulas de “Tópicos em Produção de Texto: Crítica de Cinema “na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), junto ao professor Nísio Teixeira. Além disso, Sophia dá aulas de “Literatura Brasileira Contemporânea “na Universidade Federal de Pelotas (UfPel), com ênfase em neurodiversidade e questões de gênero.
Atualmente, Sophia é youtuber do canal “Mundo Autista”, crítica de cinema no “Portal UAI” e repórter da “Revista Autismo“. Aliás, ela atua como criadora de conteúdo desde 2009, quando estreou como crítica de cinema, colaborando com o site Cineplayers!. Também, é formada nos cursos “Teoria, Linguagem e Crítica Cinematográfica” (2020) e “A Arte do FIlme” (2018), do professor Pablo Villaça. Além disso, é autora de livros-reportagens como “Neurodivergentes” (2019), “Ikeda” (2020) e “Metamorfoses” (2023). Na ficção, escreveu obras como “Danielle, asperger” (2016) e “A Influenciadora e o Crítico” (2025).
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