Selma Sueli Silva
No dia 18 de fevereiro é comemorado o Dia Internacional da Síndrome de Asperger. A SA faz parte da neurodiversidade do ser humano. Para a literatura científica, essa Síndrome está dentro do espectro do autismo e é um transtorno de desenvolvimento que afeta a capacidade de se socializar e de se comunicar com eficiência. Ainda assim, a falta de informação preocupa. Como entender que a diferença entre o autismo severo e o autismo leve está na preservação nesse último, da capacidade cognitiva e, na maioria das vezes, da linguagem, mesmo que não funcional?
Eu sou asperger. O sentimento de inadequação e a dificuldade de entender as pessoas à minha volta me fez optar pelo curso de Comunicação Social. Eu era falante, atropelava as palavras, mas ninguém tinha paciência de me ouvir. Além disso, meu vocabulário era considerado pedante e meu discurso, prolixo. Fiz Relações Públicas primeiro, embora desejasse o curso de jornalismo desde sempre. Mas não me considerava ‘madura’ para ter o que o jornalista deveria ter: conhecimento de tudo. Como assim? Era impossível conhecer tudo. Dois anos depois de formada na primeira graduação, me tornava, finalmente, jornalista.
Entretanto, o mercado era restrito e defendia a indicação em detrimento do mérito profissional. Sem contar com a vaidade exacerbada presente na maioria dos jornalistas. Parecia até pré-requisito para essa profissão. Tudo isso me fazia me sentir uma fraude. O que me salvou foi a minha obstinação (que alguns chamam de rigidez de pensamento). Fui devagar, observando, traçando analogias para, finalmente, decodificar o mundo à minha volta. Era preciso conhecer a regra do jogo para jogar. Sem problemas, me lançar ao estudo aprofundado me encantava sob todos os aspectos. Eu já havia escolhido: meu assunto predileto era gente. Queria a todo custo me entender e entender o que me cercava. A primeira grande regra aprendida: quase ninguém deseja ouvir, antes, preferem falar e falar. Ser uma boa ouvinte foi se tornando, aos poucos, minha especialidade.
Como sempre fui detalhista, gravava tudo que me era dito e, aos 14 anos, já dava conselhos a uma vizinha de 30. Mais tarde, já casada e mãe, recebi o diagnóstico tão pesquisado de meu filho: asperger. Foi quando me lancei a esse novo hiperfoco – autismo. Isso tudo culminou com meu diagnóstico, autismo leve, há um ano e meio. A notícia caiu como uma bomba em meu ambiente de trabalho e para alguns ‘amigos’. Mas para minha família não. Muita coisa passava a fazer sentido e todos puderam, finalmente, entender a Selma Sueli esquentadinha.
De lá para cá, somos, eu e meu filho, ativistas com a missão de dar visibilidade a um assunto ainda desconhecido por muitos. Em meio a crises, limitações no desempenho das atividades diárias como andar de ônibus ou pedir informação na rua, seguimos firmes. É que escolhemos jogar luz na parte que nos torna felizes: bom humor (com piadas que só nós dois entendemos), prazer em descobrir e aprofundar em nossos hiperfocos, apresentar nosso canal no YouTube, Mundo Asperger, além de divulgar nossos livros. Dois livros de meu filho, Victor Mendonça: Outro Olhar – Reflexões de um autista, ensaios e Danielle, Asperger, romance ficcional. E o meu primeiro livro “Minha vida de trás pra frente” onde revisito meu passado e descubro que o autismo esteve sempre lá.
Quanta ironia. Nada de Einsteins ou Pitágoras. Nossa paixão é a comunicação. Eu trabalhei 15 anos numa rádio de projeção nacional, faço vídeos, escrevo, danço. Tudo isso ao lado de meu filho que acumula também, o gosto pelas artes cênicas.
Infelizmente, ainda ouço: “Você era melhor quando não tinha o diagnóstico.” Nesse instante, paro, seguro a mão da pessoa, olho nos olhos e digo. “Sei disso. Antes, eu me esforçava para agradar e me encaixar. Os sorrisos eram de todos e o sofrimento só meu. Quero que me perdoe se não agrado mais o tempo todo. Ser humano é assim. Hoje o sofrimento é um detalhe e a felicidade, um estado de vida.”
Por isso, neste Dia Internacional da Síndrome de Asperger, eu e meu filho reafirmamos nossa missão de nos expor para que a falta de informação não continue magoando pessoas. Afinal, mais informação menos preconceito.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.
Continue o espetacular trabalho !!!! Estou amando! http://hiagotonha.com/comprar-curso-mini-site-ninja/
É isso mesmo Selma e Victor, muito bem! Força para continuarem! Haja mais informação e menos preconceito como diz no artigo acima. Eu frequento um coro de música Pop há uns meses e tenho-me deparado com algumas dificuldades em me entenderem…então tive de dizer a alguns que tenho síndrome de pensamento acelerado e isso me dificulta a comunicação…então já sou aceite. Logo eu a subir a palcos (mas só para cantar em grupo, não falar), que me escondia pelos intervalos da escola…até na universidade fui vítima de bulling psicológico por parte de 2 ou 3 estúpidas. Eu quase desmaiava de medo e timidez quando tinha de estar a apresentar um trabalho pra turma..eu nem sabia o que tinha dito no fim…corava, tremia, transpirava…depois de casada ainda tinha medo de entrar numa instituição Bancária (Banco), aquele ambiente tão formal e sério, muito austero e tão virado para dinheiro me apavorava e o impensável consegui: estou num coro musical teatral e aprendo muito rápido, a professora, por acaso estrangeira, me elogia. E consigo estar no Yoga sem me importar se estão a olhar…antes eu tinha vergonha se usava roupa mais justa e se alguém olhava, nunca conseguia dançar em público,…tinha medo, sei lá. Talvez um dia eu escreva minha experiência que é bem diferente da Selma, da Rita Nolasco (em Portugal) e de tantas outras Asperger, mas todas temos alguns detalhes em comum…por exemplo, tal como Selma, também adoro meu filho (eu nem pensava em emprego nenhum, só em ajudá-lo), eu aceitei em paz ser Asperger, pois me compreendo mais profundamente e me defendo melhor. E mais me desculpo pelo que passei e pela má reação de outros, excepto aos malvados/as bullies, esses não têm desculpa. Os neurotípicos também têm de “se encaixar” à nossa maneira de ser, se não prejudicamos ninguém. É triste quando estamos em convívio, e vejo neurotípicos a fugir de pessoas Aserger ou autistas como se fossemos perigosos ou vergonhosos… um grande abraço fraterno cá de Portugal . Raquel