Adriana Leister é Consultora em temas de Educação Inclusiva, Saúde e Arte. Ela é pós-graduada em Dança Educativa Moderna pela UFV. É Terapeuta Ocupacional com capacitação em Integração Sensorial, professora de Educação Especial pelo Instituto São Rafael e screener para Síndrome de Irlen pela Fundação Hospital de Olhos de Minas Gerais. Adriana é fundadora da Associação Crepúsculo e da “Interatividade Consultórios Integrados da Pampulha”.
ENTREVISTA A VICTOR MENDONÇA E SELMA SUELI SILVA
Fale um pouco sobre a sua experiência na área do TEA.
Antes me formar em terapia ocupacional eu fiz um curso de educação especial e fui professora alfabetizadora durante anos, numa clínica-escola chamada “Brincar”, em Belo Horizonte. Eu trabalhava prioritariamente com crianças com paralisia cerebral, outras síndromes e com autistas.
E quanto à Educação Inclusiva?
Ainda como professora de educação especial, sempre refletia muito sobre minha prática, e me inquietava a condição marginal das crianças e jovens com os quais eu convivia. Então, montei um grupo de teatro para questionar o universo social frente ao preconceito, e na sequência montei um grupo de dança (“Crepúsculo”) que existe ainda hoje, com o mesmo objetivo. Este trabalho cresceu e montamos uma Associação que na época se chamou “Crepúsculo – Arte e Educação sem Barreiras”. Foi nesta ocasião que comecei a dar consultoria em educação inclusiva nas escolas da prefeitura de Belo Horizonte.
Estamos muito atrasados nesse processo?
Por incrível que pareça, não. Precisamos considerar que somos sujeitos históricos e que vivemos no mínimo uns 36.000 anos de exclusão. Os movimentos de integração se iniciaram nos países nórdicos em 1965, então temos somente 53 anos de iniciação neste processo. Um processo que luta contra 36.000 anos de exclusão. Precisamos ter paciência histórica e muita coragem para DESCONSTRUIR toda uma vivência e a forma de se relacionar com a diferença enraizada a tantos mil anos atrás. Por exemplo: sei que sua luta não é fácil e que na certa morreremos sem ver o que tanto almejamos e lutamos, mas ver seus progressos e sucesso é um orgulho muito grande. De alguma forma, hoje escutamos mais falar sobre diferentes condições de vida (TEA, Síndrome de Down, Surdez, Cego etc.). Vocês estão aí entre nós! Quando eu era criança, uma pessoa com síndrome de Down era um evento; hoje, nossas crianças convivem com elas, nas salas de aula. Há muito que se ganhar e mudar, mas muito já foi mudado. Estive na Califórnia, estado mais rico dos EUA, e fui com grande expectativa com relação a visitas nas escolas. Los Angeles tem cerca de 200 escolas de ensino fundamental, todas têm TOs, mas as crianças com necessidades especiais estudam em classes especiais dentro da escola comum, coisa que vivemos há muitos anos no Brasil. Tive orgulho do meu país que, mesmo com tanta dificuldade, enfrenta o desafio da inclusão.
O que falta para que a educação inclusiva seja consolidada em nossa sociedade?
A educação brasileira tem falhas em muitos pontos, e com a inclusão não é diferente. A valorização e a remuneração dos professores são péssimas, falta formação continuada para os mesmos, falta mudança na concepção do ensino, do estudante e nas formas de avaliação. Falta infraestrutura, recursos físicos e humanos.
Quais são os desafios para os autistas e para as famílias que estão tentando a inclusão escolar.
Informar a equipe escolar, batalhar para que os professores possam ter formação continuada, realizar mudanças ambientais, no currículo e nos materiais, para promover a real inclusão, são os desafios deste processo.
Você trabalha com escolas. Elas estão abertas a mudanças físicas e de cultura para tornar a inclusão uma parte real de nossas vidas?
Há muita resistência, mas, sim, conseguimos encontrar professores e escolas abertas, em especial as UMEIS. Já adaptei muitos ambientes escolares, inclusive um parquinho de uma UMEI. Mudanças físicas, no geral, são mais fáceis que as humanas…
E a família?
A família precisa vencer o medo e resistir às quedas e dificuldades, ter uma atitude para além de humana e emocional, uma atitude política. Uma firmeza enorme e a crença na capacidade de todos evoluírem neste processo.
O que a escola pode fazer quando a família não aceita o diagnóstico?
Acolher, informar, mostrar que o que mais importa não é o diagnóstico em si, mas o desejo genuíno de ajudar aquela criança.
E quando um educador percebe traços em um dos alunos, o que fazer?
Comunicar ao seu coordenador, pedir auxílio, buscar se informar… Ler um livro, pesquisar nas redes sociais, há tanta informação de qualidade por aí.
Como lidar com a equação “Aprendizado + idade = Mudança de série” quando o autista estiver no tempo dele, mas atrasado em comparação aos colegas?
A inclusão requer o pareamento da criança preferencialmente com seus pares de idade, e deve se evitar o atraso maior que um ou dois anos. Por maior que seja a diferença no desenvolvimento cognitivo, social ou motor, é preciso considerar os anos que aquela criança já viveu. O melhor aí seria traçar um plano de desenvolvimento Individual que atenda às necessidades daquela criança no contexto de seus pares.
A mediadora é imprescindível?
Não, e inclusive pode atrapalhar o desenvolvimento da criança suprimindo sua autonomia, afastando seu professor e colegas dela. A introdução de um mediador deve ser bem planejada e é preciso treinamento.
Ao que as mães devem atentar quando o filho tem uma mediadora?
À sua formação. Ela recebe treinamento, favorece a autonomia da criança, faz ponte entre a criança, seu professor e a aprendizagem, promove sua socialização?
Do ensino infantil ao médio, o que as famílias devem observar?
Meu filho vem se desenvolvendo, enfrentando desafios com suporte? Ele tem momentos felizes? As outras crianças e alunos o reconhecem como parte do grupo? São perguntas que eles precisam se fazer, de vez em quando.
Que dica você pode dar para a família que acaba de receber o diagnóstico do filho?
O ser humano é uma mistura de genética e ambiente; por mais medonho que este diagnóstico lhes pareça, vocês podem se surpreender muito! O ser humano não nasce pronto, um bebê não aprenderá a ver sem o estímulo da luz. Os estímulos também moldam as pessoas e são cruciais para o nosso desenvolvimento. O carinho da família, sua disposição para ajudar, os recursos que vocês poderão oferecer farão muita diferença! Então chorem se preciso for, mas não se afundem num mar de tristeza. Esta criança lhes trará muitos aprendizados e grandes alegrias. Vocês terão muito do que se orgulhar!
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.
Excelentes informações para todos os Pais! Parabéns Adriana Leister!