Para esclarecer, focar no binômio saúde doença tem excluído mulheres de diagnósticos precisos. Além de tratamentos eficazes. Em outras palavras, o diagnóstico diferencial em mulheres maduras depende da cultura de gênero. Ou seja, isso é aspecto tão importante quanto qualquer outro para o entendimento da vida e da dor de uma mulher madura.
Acima de tudo, faço pesquisa sobre gênero e autismo. Dessa forma, costumo receber muitas mulheres maduras em busca de entendimento sobre si. Aliás, sobre sua história de vida. Cada vez critico os modelos avaliativos usuais. Assim, eles são aplicados a várias questões. Contudo, o padrão dos testes quantitativos não dão conta de questões da integração de saberes. Afinal, é a intersetorialidade que infere comportamentos, reações e emoções. Ou seja, isso não é só sobre saúde e doença.
Em suma, o modelo biomédico avalia as pessoas com base no que lhes falta. Ou seja, em sua incompletude. Dessa forma, os testes para autismo enfocam na ausência, retratando as pessoas autistas como doentes. Além disso, entendem que pessoas precisam de conserto.
Contudo, a neurodiversidade retrata as pessoas em sua diversidade humana. Desse modo, com potencialidades e dificuldades associadas. Certamente, essa compreensão da deficiência neurológica de desenvolvimento vê a diversidade da sociedade em termos de: etnia, religião, gênero, nacionalidade e orientação sexual. Assim, deve ser seriamente considerada no entendimento da pessoa.
O que pode ocorrer quando uma mulher madura vem para avaliação ou terapia com as seguintes queixas? Isolamento, depressão, dificuldades de socialização. Além de alterações de sono, dificuldades com a perda da cognição, dificuldades com a fluência verbal, (mesmo que anteriormente tenha conseguido essa capacidade), dificuldades em organizar a rotina, os cuidados pessoais e até esquecimentos de palavras e nomes? Se essa mulher também relata que passou anos da vida se sentindo estranha e que não se encaixava no modelo esperado da sociedade, ela pode ser autista?
Com certeza. E, se fizer um teste de memória, atenção, interação social e outros mais comuns irá apontar essa prevalência. Mas, não é isso que se esconde no exame das questões de gênero.
Em resumo, a avaliação de mulheres maduras deve passar impreterivelmente por avalições orgânicas sobre hormônios e menopausa. Afinal, a redução drástica nos níveis de estrogênio inicia um ano após a última menstruação. A produção desse hormônio começa a flutuar e diminuir durante os anos que antecedem a menopausa. Conclusão, o fato influencia diretamente em comportamentos, emoções e na qualidade de vida da mulher.
Aliás, 60% das mulheres, durante a menopausa, relatam problemas com o sono. Ou seja, fator que está associado à memória, alterações de sono, do funcionamento da cognição e ao funcionamento e estrutura do cérebro. A falta de sono interfere nos circuitos de memória. Assim como as ondas de calor que podem durar até os 60 ou 70 anos.
Quase sempre, observamos essa essa sensação em muitas mulheres. Ainda mais nessa faixa etária. Elas passaram por uma relação ao patriarcado e machismo toda a sua vida. Não é nada fácil ter que satisfazer as expectavas impostas a uma mulher. Em vários ambientes, ela pode não se sentir identificada. E a busca por esse reconhecimento pode durar a vida toda.
Então podemos descartar o autismo? Ainda não. A avaliação de autismo é clínica. Portanto, devemos considerar a subjetividade presente nos comportamentos. Afinal, é o que nos leva para além de testes padronizados. Outros pontos diferenciais são a presença de características desde a infância e adolescência. Além do histórico de similaridade em parentes.
Focar no binômio saúde doença exclui mulheres ao acesso a diagnósticos precisos e tratamentos eficazes. A cultura de gênero é aspecto tão importante quanto qualquer outro ao entendimento da vida e da dor da mulher madura.
Adrianna Reis de Sá é psicóloga clínica e professora universitária, com mestrado em Bioética pela UnB – Universidade Federal de Brasília. É especialista em saúde mental e autismo. Estuda questões de gênero e direitos humanos. É palestrante sobre temas como autismo feminino, direitos humanos e maternidade típica e atípica. Adrianna é mãe de três filhas neurodiversas. A mais velha, a ativista Amanda Paschoal.
Acessibilidades para uma explosão sensorial no autismo e o Transtorno do Processamento Sensorial (TPS) são…
Sophia Mendonça e o Budismo: “Buda é aquele que consegue suportar” e mesmo o inferno…
Crítica de cinema sem lacração, Sophia Mendonça lança newsletter no Substack. De volta às raízes,…
Conto infantil é metáfora para o autismo? Youtuber e escritora Sophia Mendonça lança contação de…
Nunca Fui Beijada é bom? Drew Barrymore é a alma cintilante de clássico das comédias…
Pensamento lógico e o autismo. O que isso significa? Tenho considerado o peso da ponderação…
Ver Comentários
Sou autista nível 1, asperger laudada recentemente aos 58 anos. Estou no climaterio/menopausa. Estou sofrendo horrores.