Arte e entretenimento

Bela Vingança é resposta urgente à sociedade patriarcal

Avaliação: 1 de 5.

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Em Bela Vingança (2020), uma jovem, traumatizada por um trágico acontecimento passado, busca vingança contra aqueles que cruzam seu caminho. A sinopse e a versão do título em português dizem pouco sobre as diversas sensações, por vezes paradoxais, que se atravessam nesta singular mescla de comédia dramática com terror e suspense. A obra  recebeu cinco indicações ao Oscar em 2021, incluindo Melhor Filme e Direção, e venceu na categoria de Roteiro Original. Este é um longa-metragem forte e necessário, capaz de levar a uma reflexão crítica refinada acerca da misoginia socialmente ainda bastante naturalizada e enraizada.

Uma história muito mais sobre resistência do que empoderamento

Bela Vingança vai muito além de uma representação na superfície do machismo estrutural. Isso porque a diretora e roteirista Emerald Fennell nos convida, com muita firmeza, a uma viagem envolvente pela trajetória da protagonista interpretada por Carey Muligan. Durante o percurso, experienciamos desde a calmaria estranha e momentos que passam uma falsa sensação de conforto e segurança até uma pretensa esperança, passando pela raiva em suas diversas manifestações, as quais vão da energia extrema à impotência frustrante. Em uma narrativa que é muito mais sobre resistência do que empoderamento, a cineasta revela os intensos desafios de ser mulher em uma sociedade como a que vivemos.

As jovens promissoras de Bela Vingança, vencedor do Oscar de Roteiro Original

Por mais privilegiados socialmente que sejam os padrões em que algumas das figuras femininas caras à trama possam estar inseridas, como o de uma jovem loira estudante de medicina, elas não estão livres do apagamento simbólico que traz consequências concretas e violentas. Nesse sentido, o título original (Promising Young Women, ou “Jovens Promissoras”, em tradução livre), revela-se muito mais coerente com o cerne da obra ao evocar sutilmente esse silenciamento. Emerald Fennell era até então mais conhecida por seus papéis como atriz em dramas de época (caso da série de TV The Crown) e por ser showrunner de Killing Eve. Seu talento e o de Carey Mulligan são o grande trunfo do longa-metragem. Afinal, a diretora e roteirista extrai tensão e humor de situações aparentemente pouco verossímeis, que soam um tanto quanto pesadas ou absurdas em um primeiro momento, mas tocam por possuírem ligação forte com a realidade cotidiana. Ao mesmo tempo em que a acidez dos diálogos revela nas entrelinhas a misoginia difundida, às vezes por meio da cumplicidade e do medo de exposição partilhados pelos homens. Assim, a cineasta não precisa apelar para a violência gráfica para impressionar o espectador, porque a construção narrativa é, por si só, impactante.

Carey Mulligan é magistral no filme Bela Vingança

O elenco também é presença marcante. Carey Mulligan, sempre uma atriz interessante, vive aqui um de seus melhores trabalhos. Dessa forma, confere nuances e paradoxos à construção de uma personagem tridimensional. Com isso, vai da força à impotência e passeando de uma aparente indiferença a um turbilhão de emoções. E se atrizes como Laverne Cox e Alison Brie brilham sempre que estão em cena, o elenco masculino tem como destaque Bo Burnham como o interesse romântico da protagonista. Afinal, ele é uma figura que trabalha com a ideia de estabilidade e do “porto seguro” masculino na relação. A escalação de Jennifer Coolidge, eficiente como a mãe conservadora após tantos papéis em comédias besteirol à la A Nova Cinderela e American Pie, é uma curiosidade interessante. Enquanto a trilha sonora oscila entre músicas tristes e alegres, mas sempre emblemáticas e muito bem afinadas às reflexões e sensações que a obra evoca, a montagem de Fréderic Thoraval é brilhante. Afinal, ela mantém envolventes as chamas da curiosidade e da surpresa. Mas, sem cair nas armadilhas que poderiam tornar a narrativa confusa.

Emmerald Fennell, uma das raras mulheres indicadas ao Oscar de Melhor Direção

Além disso, destaca-se o uso do vermelho e de tonalidades do rosa. Essas corres remetem ao imaginário popular acerca do feminino. Contudo, aparecem aqui de maneira arrepiante e que chama a atenção para o quão ultrapassados são esses e outros estereótipos visuais. Toca, inclusive, porque o vermelho também é capaz de transmitir perigo. Ao passo que os cenários conferem um tom conservador e aparentemente pacífico em meio a acontecimentos fortes. Toda essa simbologia visual faz pensar sobre a ameaça que mulheres podem representar em um sistema patriarcal. Portanto, é importante destacar a indicação de Emerald Fennell ao Oscar de melhor direção ao lado de Chloe Zhao (Nomadland), marcando a primeira vez em que mais de uma mulher está na disputa de um dos prêmios mais importantes da academia. Essa categoria teve ao todo apenas sete nomeações para pessoas do gênero feminino nos primeiros 93 anos de cerimônia. Ao contrário do que se possa imaginar, o enredo de Bela Vingança não é uma história pertinente apenas aos tempos atuais, mas só agora começa a ter chance de ser contada. E, mais ainda, só agora tem a possibilidade de ser narrada pela ótica que sublinha o feminino.

Avaliação:

Avaliação: 1 de 5.

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Em Bela Vingança (2020), uma jovem, traumatizada por um trágico acontecimento passado, busca vingança contra aqueles que cruzam seu caminho. A sinopse e a versão do título em português dizem pouco sobre as diversas sensações, por vezes paradoxais, que se atravessam nesta singular mescla de comédia dramática com terror e suspense. A obra  recebeu cinco indicações ao Oscar em 2021, incluindo Melhor Filme e Direção, e venceu na categoria de Roteiro Original. Este é um longa-metragem forte e necessário, capaz de levar a uma reflexão crítica refinada acerca da misoginia socialmente ainda bastante naturalizada e enraizada.

Uma história muito mais sobre resistência do que empoderamento

Bela Vingança vai muito além de uma representação na superfície do machismo estrutural. Isso porque a diretora e roteirista Emerald Fennell nos convida, com muita firmeza, a uma viagem envolvente pela trajetória da protagonista interpretada por Carey Muligan. Durante o percurso, experienciamos desde a calmaria estranha e momentos que passam uma falsa sensação de conforto e segurança até uma pretensa esperança, passando pela raiva em suas diversas manifestações, as quais vão da energia extrema à impotência frustrante. Em uma narrativa que é muito mais sobre resistência do que empoderamento, a cineasta revela os intensos desafios de ser mulher em uma sociedade como a que vivemos.

As jovens promissoras de Bela Vingança, vencedor do Oscar de Roteiro Original

Por mais privilegiados socialmente que sejam os padrões em que algumas das figuras femininas caras à trama possam estar inseridas, como o de uma jovem loira estudante de medicina, elas não estão livres do apagamento simbólico que traz consequências concretas e violentas. Nesse sentido, o título original (Promising Young Women, ou “Jovens Promissoras”, em tradução livre), revela-se muito mais coerente com o cerne da obra ao evocar sutilmente esse silenciamento. Emerald Fennell era até então mais conhecida por seus papéis como atriz em dramas de época (caso da série de TV The Crown) e por ser showrunner de Killing Eve. Seu talento e o de Carey Mulligan são o grande trunfo do longa-metragem. Afinal, a diretora e roteirista extrai tensão e humor de situações aparentemente pouco verossímeis, que soam um tanto quanto pesadas ou absurdas em um primeiro momento, mas tocam por possuírem ligação forte com a realidade cotidiana. Ao mesmo tempo em que a acidez dos diálogos revela nas entrelinhas a misoginia difundida, às vezes por meio da cumplicidade e do medo de exposição partilhados pelos homens. Assim, a cineasta não precisa apelar para a violência gráfica para impressionar o espectador, porque a construção narrativa é, por si só, impactante.

Carey Mulligan é magistral no filme Bela Vingança

O elenco também é presença marcante. Carey Mulligan, sempre uma atriz interessante, vive aqui um de seus melhores trabalhos. Dessa forma, confere nuances e paradoxos à construção de uma personagem tridimensional. Com isso, vai da força à impotência e passeando de uma aparente indiferença a um turbilhão de emoções. E se atrizes como Laverne Cox e Alison Brie brilham sempre que estão em cena, o elenco masculino tem como destaque Bo Burnham como o interesse romântico da protagonista. Afinal, ele é uma figura que trabalha com a ideia de estabilidade e do “porto seguro” masculino na relação. A escalação de Jennifer Coolidge, eficiente como a mãe conservadora após tantos papéis em comédias besteirol à la A Nova Cinderela e American Pie, é uma curiosidade interessante. Enquanto a trilha sonora oscila entre músicas tristes e alegres, mas sempre emblemáticas e muito bem afinadas às reflexões e sensações que a obra evoca, a montagem de Fréderic Thoraval é brilhante. Afinal, ela mantém envolventes as chamas da curiosidade e da surpresa. Mas, sem cair nas armadilhas que poderiam tornar a narrativa confusa.

Emmerald Fennell, uma das raras mulheres indicadas ao Oscar de Melhor Direção

Além disso, destaca-se o uso do vermelho e de tonalidades do rosa. Essas corres remetem ao imaginário popular acerca do feminino. Contudo, aparecem aqui de maneira arrepiante e que chama a atenção para o quão ultrapassados são esses e outros estereótipos visuais. Toca, inclusive, porque o vermelho também é capaz de transmitir perigo. Ao passo que os cenários conferem um tom conservador e aparentemente pacífico em meio a acontecimentos fortes. Toda essa simbologia visual faz pensar sobre a ameaça que mulheres podem representar em um sistema patriarcal. Portanto, é importante destacar a indicação de Emerald Fennell ao Oscar de melhor direção ao lado de Chloe Zhao (Nomadland), marcando a primeira vez em que mais de uma mulher está na disputa de um dos prêmios mais importantes da academia. Essa categoria teve ao todo apenas sete nomeações para pessoas do gênero feminino nos primeiros 93 anos de cerimônia. Ao contrário do que se possa imaginar, o enredo de Bela Vingança não é uma história pertinente apenas aos tempos atuais, mas só agora começa a ter chance de ser contada. E, mais ainda, só agora tem a possibilidade de ser narrada pela ótica que sublinha o feminino.

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