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Os direitos dos autistas e o uso do SUS

Camila Marques

Você sabia que, pelo SUS, é possível assegurar o tratamento para a pessoa autista? O Mundo Autista consultou uma advogada a respeito.

Garantido por lei desde a VIII Conferência Nacional de Saúde, de onde foi o criado o Sistema Único de Saúde (SUS), o acesso à Política de Saúde Mental é assegurado a todos os brasileiros e brasileiras. Dentro dessa política estão atendimentos variados, que vão desde o atendimento psicológico à política antimanicomial, entre outros serviços.

Nas unidades do Centro de Referência da Saúde Mental (CERSAM), subordinada à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), os serviços buscam a estabilização do quadro clínico, a reconstrução da vida pessoal, o suporte necessário aos familiares, o convívio e a reinserção social, conforme cada caso e quadro. Belo Horizonte tem 152 Centros de Saúde, cada centro tem uma equipe que acompanha os pacientes; se essa equipe detecta algum problema de saúde mental, esse paciente será avaliado pela Equipe Complementar da Regional. Cada Regional mantém a sua equipe complementar que conta com um psiquiatra infantil. Belo Horizonte possui nove regionais para atender às necessidades da população.

Nem todos têm condições de bancar os tratamentos voltados para a saúde mental, como acompanhamentos com psicólogos ou psiquiatras, ou têm conhecimento de que esses serviços podem ser usados junto ao SUS. Por isso, o Mundo Autista decidiu entrevistar a membra da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Autismo da OAB- MG, a advogada Joana Cançado*.

Segundo Joana, as demandas são muito grandes para que apenas um profissional possa supri-las por unidade. “O desafio acaba sendo maior porque a carência desses especialistas é real. A procura por neuropediatras também é grande, mas, no Município de Belo Horizonte, apenas três deles trabalham nessa área atualmente”, relata.

Os casos de urgência são atendidos no Centro de Referência em Saúde Mental Infanto-Juvenil (CERSAMI), mas a criança ou adolescente tem que estar em crise. Pais de crianças autistas podem solicitar pelo SUS o acompanhamento com psicóloga, fonoaudióloga e terapeuta ocupacional. Diante da sobrecarga do sistema, Joana vê o atendimento através de faculdades como uma alternativa, embora isso requeira fila de espera e agendamento com antecedência. “O sistema está muito sobrecarregado, uma opção pode ser o atendimento através de faculdades que oferecem o serviço de psicologia ou os atendimentos com preços sociais para pessoas de baixa renda”.

Em 2015, foi sancionado o Estatuto da Pessoa com Deficiência com um capítulo só para o direito à saúde. Ficou assegurada atenção integral à saúde da pessoa com deficiência em todos os níveis de complexidade, por intermédio do SUS. Ainda assim, Joana reconhece que, mais do que está na lei, esse atendimento precisa ser viabilizado na prática. “Os profissionais que trabalham na área de saúde têm que ter capacitação inicial e continuada. Os psicólogos atendem as pessoas com deficiência e também disponibilizam atendimento para os familiares. As leis asseguram muitos direitos para as pessoas com deficiência, mas têm que ser colocados em prática”.

A atuação da OAB como ponte para a garantia de direitos dos autistas

Nem sempre as pessoas sabem a quem recorrer diante da necessidade de buscar um atendimento, ou como funcionam os direitos na lei. Além de informar a população seus direitos, A OAB também participa de eventos variados, e envia projetos de lei para a Câmara Municipal e Assembleia, apresentado Projetos de Lei.

O primeiro papel da OAB-MG é informar os direitos que as pessoas com TEA têm, mas a maioria desconhece seus direitos porque a informação não chega a quem mais precisa. Participamos de vários eventos durante o ano todo, mas durante o mês de abril temos várias atividades desenvolvidas em parceria com Associações, Prefeitura, Escolas para conscientização da população sobre o que é o Autismo. Recebemos demandas individuais e coletivas. Já enviamos projetos de lei para a Câmara e para a Assembleia, temos que ter diálogo com os políticos para cobrarmos políticas públicas aos governantes.

Sobre a atuação da Comissão da OAB e a cobrança por atendimento da criança autista na rede pública, uma das demandas apresentadas por mães de crianças autistas à Comissão.

A Comissão fez audiência pública na Câmara dos Vereadores com várias demandas que vieram dos familiares de autistas. Entregamos o ofício das demandas para o responsável da Prefeitura que participou da audiência e ficou de dar um retorno. A Prefeitura nos respondeu o ofício alegando que está com cargo de psiquiatra infantil em aberto, mas não tem profissionais interessados.

O ideal é que a criança realizasse duas sessões de terapia ocupacional por semana, mas o Centro de Saúde só pode oferecer uma vez por semana por conta da procura. A Comissão então fiscaliza se está sendo cumprida a terapia pelo menos uma vez por semana. Em um primeiro momento o caminho é extrajudicial. O ideal é que esse encaminhamento seja realizado através do diálogo para não ter que demandar o sistema judiciário que está muito sobrecarregado. Caso seja necessário, é iniciada uma ação individual para garantir o direito que está sendo violado.

A lei 12.764/2012, conhecida como Lei Berenice Piana, diz que a pessoa com Transtorno do Espectro Autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais. Todos os direitos que são assegurados no Estatuto da Pessoa com Deficiência valem para a pessoa com Transtorno do Espectro Autista.

*Joana Cançado é formada em Direito pela Fundação Mineira de Educação e Cultura (FUMEC) e formada em Administração pelo Centro Universitário Newton Paiva. Pós-graduanda em Direitos da Pessoa com Deficiência no Child Behavior Institute of Miami/CBI of Miami, atuou em projetos que envolvem o empreendedorismo social, em parceria com o Instituto Bioterra de Belo Horizonte. É membro da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Autismo da Ordem de Advogados do Brasil de Minas Gerais OAB/MG e membro da Comissão das Associações de Direito das Pessoas com Autismo de Minas Gerais.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.

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