Hoje, 29 de Janeiro, é o Dia da Visibilidade Trans. Eu sinto que devo me posicionar, sei que a representatividade é importante, mas alguma coisa me paralisa na hora de escrever. Respiro fundo. Será o medo de romancear uma vivência desafiadora e dolorida? Ou a percepção de que essa vivência é real, perpassa a minha vida e a de tantas outras pessoas, e que a linguagem certamente não dará conta de transmiti-la em profundidade?
Posso contar inumeráveis histórias desde a primeira infância em que as pessoas reagiam com estranhamentos diversos ao meu jeito feminino mas não creio que isso seja só sobre mim. Acabo de receber uma ligação de uma pessoa preocupada com as estatísticas alarmantes em relação às pessoas trans no Brasil.
De um lado, vivo no país que mais mata pessoas trans no mundo. Do outro, a falta de empatia, contato humano e informações acessíveis e embasadas cientificamente parecem ter um papel para que as pessoas pensem “se é assim, porque você não pode simplesmente se moldar ao que a sociedade espera de você?” Isso não é uma escolha. Não é algo que se coloca em uma balança. Pessoas (e suas identidades) não são negociáveis.
A palavra “sobrevivente” me vem à cabeça, nos meus tenros 23 anos, ainda na construção de uma trajetória da qual já tenho muito orgulho. Algumas inquietações me vêm à mente. Será arrogância não temer o futuro? Será utopia acreditar em um mundo no qual as pessoas sejam valorizadas pela sua própria individualidade, por seu próprio caráter?
Atentados, como os que vem ocorrendo a pessoas trans, podem banalizar o que temos de mais precioso, a vida, mas que isso não tire o espirito de fé de cada um de nós. Sei que o caminho não é fácil, mas nós estamos aqui. Sempre estivemos e sempre estaremos. Respiro, aliviada. Sem a esperança, uma circunstância negativa pode ser fonte de sofrimento extremo.Com esperança, a mesma situação pode se tornar uma oportunidade para criarmos uma fonte de alegria e energia vital. Tudo começa com o ser humano.