Victor Mendonça e Selma Sueli Silva
“CAMALEÔNICOS’ é ao mesmo tempo o livro, a reportagem e denúncia sobre as dificuldades dos autistas para serem compreendidos. Diante da burocracia e de uma cruel indiferença, são muitos os que desistem de lutar pela aceitação, privando a todos de seus dotes peculiares. ‘A sociedade aceita mais uma palavra escrita em papel com carimbo e a assinatura que o pedido honesto pelo respeito à diferença. Entender o autismo foi fácil. Mais difícil foi entender o que eles achavam que era o autismo’. Essas opiniões estão dentre as muitas que foram colhidas pela autora — repletas de emoção, de decepção e também da esperança de quem, tantas vezes, precisa se camuflar para viver.”
Ah, como Selma sabe disso… “Camaleônicos”. Victor participou da produção do livro, participou da apuração, mas o lugar de fala, quem teve que escrever esse livro era a mãe dele. A vida toda, Selma, sem o diagnóstico, teve uma dificuldade muito grande: pressionada, ela não trabalha, e competição a arrasa. Competição, desafios… Não. Cooperação a leva a lugares nunca dantes navegados. Mas a tal da competição…
Só que, anos depois, já com o diagnóstico, ela arrumou um chefe muito danado, Victor Mendonça. “Eu quero que você escreva um livro sobre autistas adultos”, que tiveram diagnóstico depois de adultos, inclusive. Victor viu naquilo a possibilidade de uma reportagem que desse luz a tantos autistas que foram diagnosticados ou até aqueles que não foram diagnosticados ainda, formalmente, e que sofrem aí, camaleonicamente, vida afora. Ela falou com mulheres, falou com homens, falou com a especialista, doutora Raquel Del Monde, com a Natália Costa, que é diretora do Censa Betim, que trata de casos de autismo mais severo…
Vocês não têm noção da riqueza dessas vidas, do universo de cada uma dessas pessoas e de como é abrangente, muito maior do que a gente possa imaginar. Aqui tem a realidade colhida de uma autista de Portugal, a Rita Nolasco. Tem a de outra autista que mora em Portugal, embora seja brasileira, uma psiquiatra. Tem de vários outros autistas aos quais é preciso agradecer profundamente, porque toparam compartilhar a história com todos vocês, com todo o público.
A partir deste livro esperamos ajudar educadores, principalmente na fase universitária, além daqueles do Ensino Médio, a entenderem esses autistas. Porque quando eles não são entendidos, quando não têm a luz jogada em suas habilidades, eles acabam sofrendo. Caso de uma menina que desenvolveu várias condições coexistentes, antigamente chamadas de comorbidades, porque não acertavam no diagnóstico dela. Muitos vêm de diagnósticos equivocados.
O editor do livro, Roberto Mendonça, pai de Victor e ex-marido de Selma, escreveu uma espécie de prefácio em que fala sobre o quanto tanto Selma se aprimorou depois do diagnóstico. O mais importante da edição deste livro é respeitar a forma como se comunicam os autistas, cuja maior diferença está na comunicação. O editor teve essa preocupação.
Há aquele mito de que o autismo é só infantil, que só dá em criança, e hoje a gente está tendo muitos diagnósticos precoces – ainda bem, é o ideal mesmo –, mas temos que entender que o autismo é uma condição. Não é uma doença, e, portanto, não tem cura. As pessoas vão continuar sendo autistas e aprender a mascarar, sendo camaleônicos nesse mundo, mas elas vão continuar também convivendo com esse cérebro que tanto tem o potencial para o bem quanto para o mal. Depende de como a gente vai conduzir as coisas. Às condições favoráveis que entendam esse ser humano, ok: valor para a sociedade. Em condições desfavoráveis a esse ser humano, a sociedade perde elementos, talentos, valores maravilhosos.
Muitos profissionais têm medo e até receio de dar o laudo para o autista adulto porque acham que ele já viveu a vida dele, que ele dá conta. Isso é a mais pura bobagem, até porque esse autista adulto corre risco de ter uma crise e ser internado, recebendo um diagnóstico equivocado e, digamos, mais grave que o de autismo, o que pode causar consequências piores para a vida dele. O diagnóstico de autismo é um norte, em qualquer fase da vida, e é importantíssimo.
Você tem o direito de se conhecer e se aprimorar a cada dia, em qualquer idade. Sem contar que a gente é que sabe do que precisa para ter uma relação melhor com a sociedade. Só a gente sabe o que sente por dentro.
“Camaleônicos”, o livro de Selma Sueli Silva, será lançado no Simpósio Internacional sobre Educação Inclusiva, mas você já pode adquiri-lo também pelo link: https://pag.ae/7UvmCP6pp.
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