Hoje o tema é uma sugestão de internauta. Ou seja, vou abordar a relação entre autismo, cuidados com a aparência e vaidade. Bem, eu sou vaidosa. Até lembro que nos lugares em que eu trabalhei era comum destacarem meu cuidado com a aparência. Então, meus colegas falavam: “você é muito vaidosa. Em qualquer reunião que a gente não liga tanto, sempre você tem cuidados de estética, de aparência, você parece que vai dar uma entrevista para uma grande emissora de televisão ou streaming a qualquer momento.”
A gente tem que estar preparado pra tudo, não é mesmo? Mas, brincadeiras à parte, há um mito de que as pessoas autistas não têm vaidade. É engraçado isso porque é tão fora da minha realidade. Afinal, às vezes eu fico horas me arrumando, tão preocupada em como a minha aparência vai refletir. Isso porque eu olho a aparência, a maneira como eu me arrumo, como um oferecimento para outra pessoa. Mas, não no aspecto romântico. Falo no sentido de cuidado, de como eu quero acolher. Ou seja, de como eu quero estar bem e de um jeito que eu esteja confortável, para ela se sentir confortável comigo também.
Então, quando criança, a gente pode não ter alguns cuidados com aparência ou com a vaidade. Isso ocorre muito em função de questões sensoriais. Este é o caso, por exemplo, de um menino que deixa a unha crescer gigante. Também, há o caso do garoto com o cabelo grande que é alvo de piadas. Coisas do tipo: “você virou um roqueiro dos anos 80, você virou o Ronnie Von da década de 60?” Mas, na realidade, o menino com aquele cabelão, tem sensibilidade sensorial ao cortar o cabelo. Ou seja, ele pode ter uma gastura mesmo.
Porém, à medida que a gente vai entendendo os processos de interação, percebemos que a vaidade está muito ligada à essa interação. Ou seja, à troca com outro e ao desejo de ser querida e de ser amada. Novamente, isso não se restringe ao aspecto romântico. Então, à medida que você vai estabelecendo isso, consegue despertar e descobrir a sua vaidade; Este é o modo como você vai se comunicar. Também é o modo como você é, como você se sente, como você vai trazer isso ao mundo.
Também é comum que mulheres autistas sejam vistas como não-vaidosas ou masculinizadas. Nesse sentido, a questão sensorial pesa, assim como a existência de um pensamento muito lógico e pragmático. Além disso, essas características podem levar a determinadas áreas profissionais em que a vaidade feminina não é tão cobrada.
Ou seja, todo o ambiente e a interação com ele vai moldando a nossa vaidade. Mas, no meu caso, eu quero realmente ser feliz e bonita. Isso demanda tempo. Porém, por vezes eu não sei como avaliar. Então, já aconteceu de eu pesar a mão na maquiagem, por exemplo.
Enfim, sempre quero estar na melhor versão do meu corpo físico. Afinal, isso está, geralmente, ligado a como eu me porto mentalmente também. E eu acho que a vaidade é muito sobre isso. Ou seja, é sobre você se amar e amar o outro e querer que essa troca seja sempre boa. Este é um processo. Portanto, vaidade tem tudo a ver com comunicação. E se as pessoas autistas podem desenvolver uma boa comunicação, porque ela não pode se tornar vaidosa também?
Sophia Mendonça é uma youtuber, podcaster, escritora e pesquisadora brasileira. Em 2016, tornou-se a pessoa mais jovem a receber o Grande Colar do Mérito em Belo Horizonte. Em 2019, ganhou o prêmio de Boas Práticas do programa da União Européia Erasmus+.
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