Victor Mendonça

Novo ano – Como as mudanças podem gerar ansiedade e como lidar com elas

Victor Mendonça e Selma Sueli Silva

Feliz 2019. Este é o nosso ano!

Ano novo. Vida nova. Mudanças. Mas sair da rotina é um problema… Quando a família tem alguém autista, quando você tem vizinho autista, enfim, se você conhece alguém que seja autista, lembre-se da previsibilidade. “Festas, início de ano, férias, depois escola” acaba com essa previsibilidade. Acaba, mas se você antecipar, de maneira tranquila… Uma coisa de que Selma gosta muito, desde a infância é quando “chega o fim do ano, aqueles momentos de filmes de Natal”. Na cabeça dela funciona assim: está naquela época em que o ano tem filmes de Natal, que as coisas são um pouco diferentes; mais sorrisos, mais luzes…

Victor lembra que tornar o mundo previsível é uma missão impossível. A gente tem que ceder um pouco, aprender a lidar com isso, mas também ter acessibilidade para adaptar-se ao ambiente, como é o caso de uma pessoa que usa óculos. A mesma coisa com o autista. Adaptar-se ao ambiente para que seja mais agradável para ele, para que ele possa lidar melhor com suas dificuldades.

Selma comenta que as coisas vão mudando, mas a gente é um narrador de histórias e vai contando essas histórias, de maneira organizada para nossa família: para o irmão, para a irmã, para todo o mundo. Não adianta falar para o autista que “vai ser assim, assim, assim, assado”. Melhor dizer: “Olha, essa é a época do ano em que a gente prepara a árvore de Natal, é nessa época do ano que tem aqueles barulhos de fogos de artifício”. Aliás, na passagem do ano, vários lugares tiveram fogos sem barulho, por causa das pessoas e dos animas, que têm uma audição muito mais apurada que a nossa. Victor lembra que muitos autistas têm hipersensibilidade sensorial, ou seja, eles ouvem os barulhos e os percebem numa intensidade muito mais alta, o que dificulta bastante para eles.

Selma chama a atenção para o fato de que o planejamento da família deve ser feito para que as questões que possam gerar ansiedade diminuam. Não vale o pai e a mamãe — ou a vovó e a mamãe — discutir tudo na frente das crianças: “Será que a gente vai conseguir a passagem para as férias?”.

Victor comenta que esse tipo de atitude costuma desequilibrar o autista. É bom compartilhar com o autista apenas o resultado desse processo, e manter o diálogo sobre o processo entre os adultos. Se o autista for adulto, e estiver com alguma dúvida ou dificuldade, você deve explicar de maneira lógica e concreta, e ele vai entender.

Selma pontua que, mesmo com o adulto, se você falar: “Eu sou funcionário público de Minas e ainda não recebi o meu salário, a gente está completamente sem dinheiro”, o autista, tanto o pequenino quanto o adulto, vai entender: “Nós estamos ferrados. Fim de ano, todo mundo tem tudo, e a gente está sem nada”. Victor complementa que o autista entende as coisas em extremos, é oito ou 80, e não conseguem ver as nuances das situações tão bem, embora aprendam com o tempo.

De acordo com Selma, embora isso passe a impressão de que os familiares devam agir como atores, essas questões são comuns em família, mas não normais. Victor acrescenta que os pais devem proteger a si e aos filhos. Selma diz que o casamento lhe ensinou que a gente, quando está em casa, na informalidade, não toma certos cuidados com o outro. Lembra-se de que quando o “pobre” de seu ex-marido – o pai do Victor – se sentava à mesa para almoçar, ela disparava a falar sobre contas e outras questões.

Devemos ter cuidado com o outro, com os filhos, conosco. Victor enfatiza que quando a gente pensa muito nesses problemas e desafios de começo de ano, acaba não aproveitando o lazer e os momentos em família — o lúdico no sentido da diversão, do entretenimento que a gente pode ter. Tornar a vida e leve e bem-humorada.

Para Selma, você conhece seu filho, seu adolescente ou criança, seja se for para sair ou ficar em casa. Tem autista que ama água; então, deve-se saber em sua cidade dos programas dentro da secretaria de Cultura. Pode parecer bobagem, mas a gente não sabe dos programas que existem em nossa cidade. Victor observa que ele e a mãe aprenderam a olhar Belo Horizonte, a cidade onde vivem, com olhares de turistas, e ambos descobriram outra cidade. Para Selma, como muitos autistas gostam de dinossauros, uma boa opção é o Museu de Ciências Naturais da PUC-Minas (Rua Dom José Gaspar, 290 – Belo Horizonte, MG) em que a visitação nas férias é ótima. Tem colônia de férias, tem passar a noite no museu, tem muita coisa, então devemos ficar antenados. Uma mamãe pode passar dicas para outra.

Mas, se você não quer ficar em sua cidade, você quer viajar… Victor lembra que este é mais um desafio, tirar o autista da rotina previsível, do quadrado dele. Selma complementa que há diferentes tipos de mãe. Tem aquela que vai viajar de avião e diz: “O meu filho é autista e as pessoas têm que entender, e se alguém vier falar comigo eu monto o barraco.” Monta o barraco à custa do filho, à custa de você (da sua saúde, complementa Victor). Eles concordam que tudo o que os pais puderem fazer para evitar o próprio estresse e o dos filhos vai ser bom para todos. Selma completa o raciocínio: Compre a passagem e avise: “Meu filho é autista e é necessário um acompanhamento”.

Quando comprar sua passagem, observe se seu assento fica mais ao fundo. Conversando, talvez você troque por um assento na frente. Selma se lembra de uma vez em que ela e o Victor ficaram do meio para trás, e foi entrando muita gente… Sem falar daquela vez em que começaram as instruções e os dois autistas perceberam que estavam na saída de emergência… São coisas que a gente pode antecipar para tentar evitar na hora da viagem. Certa vez, o aeroporto estava em construção… Imaginem aquelas marteladas na cabeça de Selma e Victor. Por isso, a gente tem que ter sempre um plano B.

Victor relembra que quando chegamos ao destino, nas férias, a gente deve buscar trazer um pouco da rotina e planejamento para lá também. Por exemplo: O que fazer quando vamos viajar por sete dias? A gente vai buscar ter uma rotina nesses sete dias, um planejamento parecido em cada um deles, mesmo que seja com atividades parecidas. Selma diz que “isso não é neura”, e Victor sublinha: “Cada um conhece a dor e delícia de ser o que é”. Com a hora do lanchinho, por exemplo, planejada, o autista fica mais seguro e tem, inclusive, maior liberdade para se permitir descobrir coisas novas, porque ele não está ansioso tentando entender aquilo tudo que está ao redor. Ambos concordam que ter a hora certa para o lanche, o banho, o sono, facilita bastante.

Feliz ano novo. É um prazer estar com vocês em 2019, também. Aproveitem e até a próxima!

Mundo Autista

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