Camila Marques
Com o conceito de narrativas de vida cada vez mais em alta, autores compartilharam suas próprias vivências em nome da promoção da inclusão e da desconstrução do preconceito.
Na noite da última quarta- feira (4), o Mundo Asperger promoveu uma roda de conversa internacional com autores inclusivos. Além de promover a literatura inclusiva, o encontro proporcionou aos presentes uma importante reflexão sobre o protagonismo da própria vida através da narrativa da própria existência. Mais do que contar uma história, a literatura inclusiva promove o protagonismo da vida para aqueles que sempre foram predestinados a viver com limitações através dos diagnósticos.
Na abertura do encontro, Victor Mendonça lembrou sobre a importância da arte na transformação da realidade. “A literatura transforma vidas, transformando a realidade social”. Estiveram no encontro a Dra. Ângela Mathylde Soares, Lucia de Anna, Mariana Rosa, Mônica Rahme, Marta Alencar, Priscila Fonseca, Meiry Geraldo, Pedro Muriel, Sônia Pessoa e Roberto Mendonça. A mediação da roda de conversa foi realizada por Victor Mendonça e Selma Sueli Silva.
Mônica Rahme, professora na Faculdade de Educação da UFMG(FaE/UFMG), lembrou da importância da universidade no papel da promoção da inclusão. “A universidade tem promovido a discussão sobre as diferenças, para que os professores e alunos saiam daqui com novos olhares. Nós temos um grupo chamado Corpos Mistos, cuja função é promover a abordagem da inclusão,” disse. Uma importante conquista destacada pela professora foi o aumento de pessoas negras dentro da instituição. “A UFMG deixou de ser uma universidade branca, o que significa que, aos poucos, o quadro está mudando”. Por outro lado, ainda há muitos desafios para a promoção real da inclusão. Em 2018, 680 vagas foram reservadas para alunos com deficiência. Neste ano, a quantidade caiu para 319. A mudança ocorreu graças a releitura dos critérios adotados pelo IBGE para a classificação das pessoas com deficiência.
Através da literatura, mães encontraram apoio na busca por inclusão, ampliando a rede de discussão
A jornalista, escritora e ativista Mariana Rosa, encontrou uma nova forma de viver após o nascimento da filha, Alice, em 2013. A menina nasceu com paralisia e Síndrome de West, o que afeta seu desenvolvimento. Desde então, Mariana criou o blog Diário da Mãe da Alice, além da página no Instagram e no Youtube. Na internet, a jornalista além de compartilhar o cotidiano com a filha, Mariana se posiciona sobre os direitos das pessoas com deficiência.
“A escrita passou a ser aliada para que eu possa ter qualidade de vida, a Alice, pela nossa garantia de direitos. Podendo ser também ponte para as outras pessoas.” Mariana Rosa.
Sônia Pessoa, jornalista e também professora do Departamento de Comunicação Social da UFMG. Uma das fundadoras do AFETOS (2017), o grupo de pesquisa tem como proposta a partilha de pesquisas e vivências acerca de grupos em situações de vulnerabilidade. A vivência com o filho Pedro(2006 -2016), levou a mãe para a compartilhar suas experiências.
“Quando fui fazer um doutorado-sanduíche na França, mesmo com todas as limitações, o Pedro foi comigo. No ano em que ele completaria 10 anos, ele morreu.”
Para a pesquisadora italiana Lucia de Anna, da Univ ersità degli Studi di Roma, a sociedade ainda resiste a promoção da inclusão dificultando a mesma. Na instituição onde leciona, a professora usa também livros e filmes a fim de promover a discussão sobre a inclusão. Sobre a autobiografia, a pesquisadora colocou: “ É muito importante narrar e narrar- se a si mesmo.”
A arte como forma de expressão
Para o poeta Pedro Muriel, ser um exemplo de superação não é uma prioridade, mas sim viver bem e da melhor forma. Diagnosticado com uma doença rara e progressiva aos 24 anos, o escritor encontrou na arte a forma de se colocar no mundo.
“Meu papel no mundo é fazer com que minha poesia entregue ao mundo uma maneira de se expressar. E mundo se esquece disso. Não quero ser um exemplo, mas quero mostrar que é possível ter uma vida normal. Se ouvirmos uns aos outros, as dificuldades ficam menores.Em um mundo de fronteiras, precisamos ser pontes.”
Questionado por Victor sobre a relação da arte com a inclusão, o também jornalista e escritor Roberto Mendonça recordou: “Enquanto houver ignorância, alguém ficará de fora. Quando vemos algo pela arte, tudo fica mais leve e mais fácil.” Durante o evento, a design visual, desenhista e poetisa Priscila Fonseca realizou um desenho com os pés. Criadora do projeto “Feito com os pés”, Priscila é formada pela UEMG e prefere não ser retratada como um exemplo de superação, mas sim como alguém que faz, dentro das possibilidades que possui, uma vida possível.
“Incluir é conjunto ”
Foi com a frase acima que a prof.a. Dra. Angela Mathylde, psicoterapeuta e presidente do Brain Connection no Brasil abordou sobre o conceito básico de incluir. Para Ângela, a sociedade ainda não se dá conta ainda do que é a inclusão. “Estamos formando ilhas inclusivas e não nos juntamos. As pessoas se juntam sem estudar, sem pesquisar. A inclusão é a busca por solução. Precisamos sair da patologia.”
Ângela Mathylde falou sobre o conceito de incluir.
E foi pensando em sair do ciclo de patologia que a psicóloga Marta Alencar pensou em uma estratégia diferente para usar com uma paciente. Idealizadora do projeto Tina Descolada, Marta encontrou na representatividade uma forma de lidar com uma paciente. “Eu percebi que poderia ajudar no lidar com as diferenças através da educação inclusiva”, afirmou.
Marta Alencar falou sobre a personagem Tina Descolada.
Selma Silva Sueli e Victor Mendonça ainda compartilharam com os presentes sobre o diagnóstico de ambos, um aos 11 anos e outro aos 53 e a vida desde então. Sobre a desconstrução do olhar ruim acerca da deficiência, Selma considerou: “Se a gente muda, a sociedade também muda.” Ao final do encontro, os presentes puderam compartilhar suas experiências e dividir suas dívidas com os convidado
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