Selma Sueli Silva e Camila Marques
Selma Sueli Silva e Camila Marques falam sobre a pressão estética que as mulheres sofrem, seja pelo ideal de beleza imposto, ou pela cobrança em parecer jovem.
Selma Sueli Silva: Hoje, a gente vai falar sobre a pressão estética sobre a mulher, que nos cobra, desde a infância, o enquadramento nos estereótipos dos lacinhos e outros acessórios. A escolha do esmalte é feita desde cedo. Será conservadorismo? Talvez, mas a gente sabe que a vida é feita de fases e por sabedoria e não aproveitamos a fase que estamos vivendo, isso vai dar problema lá na frente. O que você pensa disso, Camila?
Camila Marques: Bom Selma, outro dia, eu estava assistindo a uma entrevista com a jornalista Carla Vilhena, e ela afirmou: “A mulher não passa dos 50 anos na TV, eu estava um dia conversando com uma pessoa e pedi para ela falar de alguma jornalista atuante, na TV aberta, depois dos 50. Ela citou a Ana Maria Braga, mas a Ana Maria Braga não é jornalista. E isso, Selma, me lembrou um episódio da própria Carla mesmo. Ela foi criticada pela questão da sobrancelha, porque ela tinha a sobrancelha grossa. Eu fiquei pensando nisso, porque a gente está com essa questão questão do debate sobre a beleza em todas as idades. Hoje, está em alta, a harmonização facial, em que todos vão para as clínicas para harmonizar o rosto e fazer outros procedimentos. Eu penso que, às vezes, a gente vai entrando dentro do sistema e dos padrões e não prestamos muita atenção nisso.
Na minha pesquisa sobre a imagem da mulher negra, eu observo sobre como era a estética há 10 anos e como é hoje. Eu notei que muitas pessoas têm realizado preenchimento labial, além da sobrancelha com henna. Não estou falando que é seja feio e muito menos estou fazendo juízo de valor. O que eu digo é que o padrão vai ficando tão comum, e nós encontramos os mesmos traços nas pessoas.
Selma Sueli Silva: Verdade, no Instagram, se você analisar as mulheres entre 20 e 30 anos, você percebe que o cabelo, a pose, tudo é igual, o que padroniza e pasteuriza a imagem, a estética.
Camila Marques: Sim. Por exemplo, eu gosto muito da referência de moda da década de 30 até a década de 1960, que foi a época da Marilyn Monroe, da Elizabeth Taylor e Sophia Loren: são belezas muito diversas. A própria Grace Kelly e a princesa Diana, que veio depois, são belezas de Hollywood, mas belezas diversas. É a questão de todo mundo ter a sua beleza. Eu mesma, durante muitos anos, convivi com a pressão de ter o cabelo liso. Já aconteceu de eu chorar, reclamar e falar com minha mãe que eu queria um mega hair. Porque na escola onde eu estudei, todo mundo usava o cabelo até a altura da cintura.
Selma Sueli Silva: É muito ruim e graças a imposição da sociedade, arrumamos sofrimento para a gente que não devia existir.
Camila Marques: Verdade, cabelo grande não tem a ver com ser ou não feminina. Hoje, existe uma linha pensamento em que algumas mulheres não querem se arrumar para não se submeterem a esses padrões. No meu caso, ser feminina é um prazer, eu gosto de fazer unha, eu gosto de me maquiar. Para mim, é um hobby. Mas, para outras mulheres, não, é uma imposição.
Lá fora, os programas de TV não exigem a pressão estética, como tem aqui no Brasil, para quem usa a imagem para trabalhar. Porque, a imagem diz sobre gente. Seria bobagem eu afirmar aqui que não, que não tem a ver, que é a essência que diz sobre nós. Mas o estilo diz sobre a pessoa, também.
Selma Sueli Silva: Sim, mas existem algumas regras para apresentação em vídeo. Você, ao apresentar um programa para os internautas, e colocar um brinco bem grande, instintivamente, a atenção de quem vê se volta para os brincos. Eu me lembro da Fátima Bernardes falando: “Nossa, que delícia! Agora eu posso usar as pulseiras que eu amo tanto”. Porque, no Jornal Nacional, se ela ficasse usando as pulseiras, a atenção do olhar iria para as pulseiras e aí, haveria conflito de imagem e perda para a fala, de fato. Já a regra de “todo o mundo tem que ter o cabelo longo” ou então, na altura do ombro, é invasiva.
Camila Marques: Então, as coisas vão entrando em movimento, são dinâmicas. E nós estamos em movimento também, falando e repensando posturas. Porque há um caminho a ser trilhado e assim continuamos, seguimos em frente.
Selma Sueli Silva: É muito triste tantos sofrimentos desnecessários. Da adolescente que, por causa de biotipo, é mais gordinha. E o ideal é que a adolescente “seja fofinha e bonitinha mas magrinha”. É muito triste o ideal da adolescente de “ter os cabelos lisos e esvoaçantes”. Já aquela que tem o cabelo vermelho, e aquela que tem o cabelo afro, estão fora.
Uma coisa que me chama muito a atenção, inclusive, é a dificuldade que a gente tem em aceitar o cabelo afro. Eu acho lindo, cacheado e alto. Eu fico observando, na rua, que esse tipo de cabelo é muito reparado, como se fosse algo que não pudesse ser dessa maneira. Na verdade, a pessoa tem de ser do jeito que ela quer ser. Na década de 1990, se eu fosse a uma festa com meu cabelo natural, mais cacheado, eu podia estar belíssima, com o melhor vestido do mundo, que achavam que não estava arrumada. O meu cabelo natural era sinônimo de desmazelo. Isso é muito chato. Temos que tomar cuidado, porque embora a gente perceba isso, a gente mesmo julga muito. “Ah, mas aquela mulher, daquela idade, vestindo aquela roupa? Não combina.” A coisa é tão terrível que, certa vez, passaram a mão na minha bunda dentro do lugar em que eu trabalhava. Há uns 10 anos, se não me engano. Eu fiquei indignada. Eu não vi quem foi e quem viu não quis contar. Mas havia câmeras e eu peguei a imagem do circuito interno e vi quem foi. Foi um senhor de outro departamento. Ele nunca me pediu desculpas e não fala mais comigo, parece que foi ele o ofendido. Mas, o que mais me doeu foi a fala de um dos diretores: O que é isso? Essa mulher está chegando aos 50 anos, deveria agradecer, ainda mais com tanta jovem aqui, ele escolheu a bunda dela para passar a mão.”
Camila Marques: Que absurdo!
Selma Sueli Silva: Verdade. E isso dói. E quem falou acha que estava elogiando, o que dói mais ainda. Então, quer dizer que agora eu vou ter que ser a “gostosa do pedaço”, que qualquer homem que me elogiar eu tenho que agradecer por que eu estou velha? São coisas que acabam prendendo a mulher num estereótipo que se ela aceita, Camila, depois ela paga o preço, porque ninguém quer morrer no meio do caminho. A velhice é uma sequência natural.
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