Ei, Lino: A gente deixou de se ver, pessoalmente, em julho de 2015. Eu saía do Rádio Vivo e da Itatiaia. Não nos despedimos. Eu não conseguiria. Aliás, nunca mais voltei à Rádio, a não ser quando acompanhei minha filha para uma entrevista ao Eduardo Costa. Eram lembranças demais – boas e outras, nem tanto assim. Afinal, somos humanos.
Nesta época, eu ainda não sabia que era autista. E você aguentou minha falta de freio social, tantas vezes. Eu falava sem medir as palavras, às vezes era dura, ou emotiva demais, ou sincera demais. Não me arrependo. Mas precisei de alguém que fosse igualmente duro, sincero e emotivo. Sim, eu sabia ler sua emotividade quando você tentava esconder de todos. Você era de um tempo em que as emoções eram proibidas aos homens. Por isso, se assustava tanto quando eu parecia ler sua alma.
Vivendo ao seu lado, me lembro de ter pedido: “Promete que nunca vai ter raiva de mim?” Você entre curioso e surpreso perguntou: “Por quê?” A resposta veio direta: “Porque você é muito cruel quando sente raiva.” E você direto também: “Curioso, ninguém nunca reclamou…” Emendei: “Ninguém fala na sua frente, ora!” Você riu e disse: “E você fala, não é?” Sim, Lino. Eu sempre disse tudo assim. Cheguei a ser inconveniente, eu sei. Mas fui completamente transparente com você. O que pode ter inviabilizado nossa convivência depois de minha saída da rádio, vai saber!
Mas como me derramo de mim mesma, escrevi uma mensagem, por whatsapp, há uns 3 anos ou mais, e disse que ainda que não concordasse com tudo que você fazia ou dizia, gostava muito e tinha o maior respeito por você. E gratidão! Você me apresentou e levou a rádio. Aprendi muito com você. Você fez uma pausa, respirou e disse que também havia aprendido muito comigo e que, como eu, também gostava muito de mim.
Eu acreditei pois entendo que uma história não se diz por um momento. Ela é o somatório de várias vivências. Eu não costumo desprezar nenhuma. A partir das vivências e de seus aprendizados é que podemos deixar nossa contribuição ao mundo, afinal.
Até aqueles momentos em que minha pressão subia, ante meu espanto da forma mais seca que você lidava com algumas situações profissionais, eu agradeço. Me fortaleceram para ser uma profissional mais segura e consciente de minhas ações. Você era difícil, sabe? Ô geniozinho complicado… Mas não me queixo. Prefiro os autênticos. Os que são como são. Humanos, até. Pois assim, me sinto à vontade para ser quem eu sou também.
Nossa relação profissional e de amizade foi assim, lembra? Eu também não era fácil. Ouso dizer que já te disse coisas que você nunca pensou ouvir. Um dia você me disse, na frente de toda a redação: “Selma, eu me ocupo de sua vida?” E eu: “Nunca.” E você: “Faça o mesmo, tá bem?” Ixi, você tinha razão. Mais tarde, pedi desculpa. Você não devia estar acostumado com isso. “Não precisa.”, conciliou. Mas era preciso, sim. Você tinha razão.
Que bom que em setembro passado, resolvi ligar: “Falar que os anos de convivência deixaram saldo positivo. Que não deviam ser lembrados pela nossa não despedida.” Você concordou. Conversamos por um bom tempo. E com a voz leve nos despedimos. Com muita ternura. E é assim que eu vou me lembrar de você. Siga na paz que nem sempre é nossa companheira por aqui, em tempos conturbados como esses. #rip
Selma Sueli Silva é criadora de conteúdo e empreendedora. É articulista na Revista Autismo (Canal Autismo) e Conselheira da Unesco Sost Transcriativa. Em 2019, recebeu o prêmio de Boas Práticas do programa da União Europeia Erasmus+.
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