Depois de meu diagnóstico, era comum ouvir das pessoas que essa ou aquela característica, elas também possuíam. Não vou nem falar da chatice que é ouvir isso. Entretanto, o que essas pessoas precisam entender é que o autismo é composto de uma série de características. Assim, para estar dentro do espectro, é necessário analisar a combinação delas. Além disso, é preciso medir a quantidade dessas características e o mais importante: se ainda há perdas para a vida da pessoa na fase adulta. O somatório de tudo isso, define se você vai estar ou não dentro do TEA. E mais: define também, o grau de vulnerabilidade do autista.
Há casos em que, na fase adulta, os médicos optam por não fornecer o laudo. Significa que a pessoa saiu do espectro? Definitivamente não. Significa que as estratégias e máscaras criadas por esse adulto não traz prejuízo à vida dele. Ou seja: ele conseguiu se tornar um autista que muitos chamam de funcional. Mas que eu prefiro dizer que as características do autismo e suas combinações já não trazem prejuízo a este adulto. Nesse caso, fico pensando que essa escolha devia ser do próprio autista.
Voltando às pessoas que dizem que são assim ao ouvir a pessoa autista descrever alguma de suas características. É preciso que fique claro: quando falamos dessas características, está implícito a medida de uma alta intensidade delas. Por exemplo: é comum dizerem que as mulheres não são boas para localizar lugares e destino ao volante. Sim, é verdade que a maioria funciona assim pelo que sabemos cientificamente até aqui. Mas a maioria já se perdeu voltando para casa? Ou indo até a casa da mãe? Eu já. Muitas vezes.
Antes que alguém fale que isso é burrice e não característica do autismo, eu explico: Todas as vezes que me perdi voltando para casa houve um desses fatores:
Exaustão após um dia de sobrecarga de trabalho e/ou emocional.
Eu havia acabado de receber uma notícia impactante.
Eu precisava chegar rapidamente e meu cérebro já traçava o repertório de tarefas a fazer.
Havia um imprevisto no caminho: obras, blitz, acidente etc.
Eu estava muito feliz. Mas muito mesmo. Então, meu destino passou a ser um detalhe sem importância. Meu foco era a sensação deliciosa que eu experimentava. (Ops!!!)
Portanto, imaginem: o cérebro neurodivergente é uma condição neurológica. Dessa forma, o cérebro de autistas é mais rápido em certas áreas e mais lento em outras. Assim, o cérebro dos autistas processa sinais sensoriais mais depressa que o normal. Já as respostas do núcleo caudado direito, região do cérebro ligada ao aprendizado e ao controle de impulsos motores, são mais lentas, (estudo feito por britânicos e japoneses).
Apesar de o núcleo caudado processar informações mais lentamente no cérebro de pessoas com autismo, ele tem mais neurônios. Segundo os pesquisadores, isso pode contribuir para padrões comportamentais recorrentes e repetitivos, bem como as dificuldades de comunicação e interação enfrentadas pelos autistas.
Antes, então de dizer ao autista: “Bobagem, eu também sou assim.”, pense que o cérebro do autista é um cérebro neurodivergente porque processa de maneira diferente algumas características que todas as pessoas podem ter. Mais estudo e menos julgamento para conseguirmos ser mais empáticos.
Selma Sueli Silva é jornalista, radialista, youtuber e escritora. Especialista em Comunicação e Gestão Empresarial e autista. Autora de três livros e diretora do documentário “AutWork – Autistas no Mercado de Trabalho”
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