Camila Marques
Ganhador do Nobel acredita na educação como melhor método anticrime.
Ao pensarmos em criminalidade, logo associamos a ação policial e sua efetividade aplicada à apreensão, ações de combate ao tráfico de drogas e outras formas de repressão. Dados apresentados pelo Atlas da Violência, em 2018, apontaram que, em dez anos, 553 mil pessoas perderam a vida por homicídio no Brasil. Até junho de 2019, a população carcerária no país era de 773.151 pessoas. Comparado com o ano 2000, esse número triplicou, conforme o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) divulgou em fevereiro deste ano. Ainda segundo o Depen, a maior parte das pessoas que estavam presas até junho do ano passado cometeram crimes relacionados à Lei de Drogas (39, 4%), sendo apenas 11,31% relacionados a crimes contra a pessoa como homicídio, aborto, violência doméstica e outros.
A falta de mobilidade social é, sem dúvidas, um dos pilares da criminalidade. Não, não existe crime e tráfico somente nas periferias, mas a falta de oportunidades e de possibilidades de ascensão afeta aos mais pobres, principalmente. Por uma questão de dívida histórica, a violência e a criminalidade atingem, principalmente, os negros e pobres no Brasil.
O que seria, então, a solução para a criminalidade? Para James Heckman, a melhor estratégia anticrime é investir em educação para crianças de 0 a 5 anos. Heckman é economista norte-americano, vencedor do Nobel de 2000. O economista relacionou a primeira infância com a desigualdade social e o potencial que há nessa fase da vida para as mudanças que possam tirar as pessoas da pobreza. Em seus estudos, ele concluiu que o retorno financeiro para cada quantia investida em uma criança é alto.
No ano 2000, Heckman teve acesso aos dados do Perry Preschool Project, em um experimento que funcionou da seguinte forma: em 1962, na pequena cidade de Ypsilanti, nos Estados Unidos, 123 alunos da mesma escola foram divididos, aleatoriamente, em dois grupos. Com 58 crianças, um desses grupos recebeu educação pré-escolar de alta qualidade, e o outro, com a quantidade restante de crianças, não teve a educação pré-escolar. Esse foi o grupo de controle.
A proposta foi testar se o acesso a uma boa educação infantil melhoraria a capacidade de crianças desfavorecidas para obter sucesso na escola e na vida. “O consenso quando comecei a analisar os dados era de que o programa não tinha sido bem sucedido porque o QI dos participantes era igual ao de não participantes”
, lembra Heckman, anos depois, em conversa com a BBC News Brasil.Com isso, ele passou a analisar os dados com outro olhar: em vez de avaliar o QI, decidiu avaliar habilidades sociais e emocionais, daí chegou à conclusão. Em maio de 2019, ele divulgou uma nova pesquisa, desta vez realizada em parceria, na Universidade de Chicago.
Durkheim já apostava em socialização na infância
O sociólogo francês Émile Durkheim (1858- 1917), considerado pai da Sociologia Moderna, já reconhecia a dependência do indivíduo da sociedade para a sua formação, uma vez que a socialização é um processo dinâmico. A socialização é realizada a partir do processo de educação do indivíduo. O ambiente e o tempo influenciam nisso. Durkheim divide o processo de socialização humana em três fases. Por aqui, falaremos de forma resumida.
Fase primária – ocorre ainda na infância. A falta de experiência da criança a faz acreditar em tudo a sua volta. É a chamada aprendizagem por imitação ou aprendizagem incondicional.
Fase secundária – típica da adolescência, o indivíduo não é mais criança, mas não é um adulto. É a fase dos questionamentos.
Fase terciária – é quando o indivíduo entende que “cada um deve ser maduro o bastante para arcar com seus atos, não havendo assunto inquestionável ou proibido”. No entanto, não parece ser algo plenamente fácil de ser alcançado, uma vez que os questionamentos acompanham o ser humano ao longo da vida.
Embora haja críticas à proposta apresentada por Durkheim, é concreto e comprovado que o ser humano é reflexo de suas vivências e experiências adquiridas, sendo moldado por elas ao longo da vida. O que podemos perceber com isso é que, embora seja o óbvio que a política de segurança pública seja determinante para a sociedade, a educação não deixa também de ter a sua contribuição. Assim, percebemos que, mesmo em áreas diferentes, as atuações devem ser conjuntas.
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