No estúdio, eu me sentia completa, inteira. Podia dar minha opinião pessoal e como jornalista que sou. Alguns ouvintes ficaram surpresos com meu diagnóstico e me perguntavam: “como isso é possível se você se expressa tão bem?” Eu explicava que falar, dentro de um estúdio, para milhões, sobre assuntos que eu dominava, era bem mais fácil que o diálogo com 2 ou 3 pessoas. Eles insistiam: “Mas você é tão afetiva”. E eu: E por que não seria? Amo as pessoas, mesmo que me sinta incomodada no meio da multidão.
Selma Sueli Silva
Eu trabalhei durante 15 anos numa rádio de Belo Horizonte. Produzia um programa estilo ‘talk show’ e participava de um dos quadros chamado Debate.
Éramos 3 convidados que discutíamos temas do dia a dia, notícias, política, relacionamentos e coisas assim. Eu ainda não sabia do meu cérebro neurodivergente e não foi uma, nem duas vezes, que o apresentador se confessou preocupado pois, segundo ele, eu me expunha demais.
Além disso, normalmente minha opinião gerava surpresa à maioria dos ouvintes. Contudo, sempre recebia mensagens e, em todas elas, os adjetivos autêntica e coerente estavam presentes.
A audiência era muito boa, pouco mais de 200 mil ouvintes por minuto, em horário nobre do rádio, pela manhã, e a interação era feita por telefone e virtualmente. Mais tarde, eu descobriria que meus ouvintes eram um grande patrimônio, pois eles seguiram comigo quando saí da Rádio, em 2015.
No estúdio, eu me sentia completa, inteira. Podia dar minha opinião pessoal e como jornalista que sou. Alguns ouvintes ficaram surpresos com meu diagnóstico e me perguntavam: “como isso é possível se você se expressa tão bem?” Eu explicava que falar, dentro de um estúdio, para milhões, sobre assuntos que eu dominava, era bem mais fácil que o diálogo com 2 ou 3 pessoas. Eles insistiam: “Mas você é tão afetiva”. E eu: E por que não seria? Amo as pessoas, mesmo que me sinta incomodada no meio da multidão.
Quando eles iam até à Radio me conhecer, falavam: “Mas você é a mesma pessoa que eu ouço no rádio. Autêntica e coerente.” Aí, eu ria e explicava que havia passado por treinamento rigoroso para conseguir me sentir mais natural com as pessoas. E que minha dificuldade maior de comunicação era falar de mim, de meus sentimentos, minhas emoções. Além disso, meu cansaço ao final do dia, era proporcional às exigências sociais dessa rotina.
Mas todo meu esforço sempre foi recompensado pela riqueza que percebo no ser humano. Hoje sei que, embora ainda seja difícil para mim, somos seres sociáveis. Negar isso a quem tem dificuldade para se socializar é, no mínimo, desconsiderar que cada um tem suas características e que é a convivência de tantas características diferentes que nos permitem ampliar nossa visão para enxergar a riqueza e todas as possibilidades do ser humano.
Selma Sueli Silva é jornalista, radialista, youtuber, escritora, cineasta, relações públicas e pós-graduada em Comunicação e Gestão Empresarial. Foi diagnosticada com TEA (Transtorno do Espectro Autista) em 2016. Mantém o site “O Mundo Autista” no Portal UAI. É autora de três livros e diretora do documentário “AutWork – Autistas no Mercado de Trabalho”.
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