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Desenvolvimento corporal com arte e diferença

Camila Marques

Por que associamos a arte na vida da pessoa com deficiencia apenas à terapia? Projeto da UFMG me levou, principalmente, a essa reflexão.

Criado em 2017, o projeto “Arte e Diferença”, tem como missão desenvolver oficinas artísticas que articulam o trabalho com o corpo à improvisação, ludicidade, ao trabalho autoral. A singularidade humana é celebrada, visando sempre à expansão de suas habilidades. O projeto conta com a participação direta de estudantes dos cursos de Artes Cênicas, Dança, Música, Pedagogia, Psicologia e Terapia Ocupacional da UFMG. O grupo se reúne, semanalmente, para a realização das atividades.

Com a quarentena, as reuniões foram suspensas. Porém, o grupo decidiu manter as atividades de forma online. No mês da conscientização sobre o Autismo, o grupo realizou na última sexta-feira, 24, junto com o Grupo de Estudos Corpos Mistos, o 1º Cine bate-papo com o filme “Um Passo de Lado”, realizado pela professora Anamaria Fernandes e Michel Charron. O filme é fruto do trabalho da Companhia Dana, realizado em 2010, no Centro Hospitalar Placis Vert (Casa de Acolhimento Especializado), localizado em Thorigné Fouillard, oeste da França. As atividades envolvem um trabalho de dança e improvisação com jovens autistas.

Na sexta, eu acompanhei a reunião online com a professora Anamaria. E, durante a semana, conversei com a professora Mônica Rahme, também participante do projeto. Ao perguntar se o projeto Arte e Diferença tinha finalidade terapêutica, por realizar atividades com alunos especiais, Mônica respondeu que o projeto articula arte e educação, mas não tem finalidade terapêutica. “Buscamos que as (os) participantes percebam seus corpos e os corpos dos outros, inventem movimentos, sintam-se mais livres para criar, fazer movimentos e interagir”, salientou. Mônica explicou que a neurodiversidade está contemplada no projeto,:

“O projeto busca acolher a diversidade humana. Trabalhamos com o conceito de “contatos mistos”, discutidos por Erving Goffman, que busca promover o contato entre públicos distintos. As oficinas do projeto acontecem às quintas-feiras, de 9h30 a 10h30 no Teatro Universitário, que fica na Escola de Belas Artes/UFMG. Nosso projeto acolhe os jovens e adultos em situação de deficiência, bem como todas as pessoas que desejam participar das oficinas”.

Na sexta, além de mim, alunas e participantes do projeto, o bate-papo contou com estudantes do Rio de Janeiro, o que possibilitou uma troca mais rica. A professora Anamaria apontou a relação entr e a atividade realizada no projeto e a arteterapia,:

“A arte não é uma terapia, porque não sou arteterapeuta. É uma questão ética e política. Quando a pessoa é deficiente, classificamos a prática como terapêutica. Se fazemos uma aula de dança, não tratamos como terapia. Isso é recorrente. Então, tiramos da pessoa deficiente o direito de fazer arte. Quando eu não vejo essa pessoa com potencial para apreciar uma arte, me privo de desfrutar o inverso”.

O nome do filme (“Um passo de lado”) surgiu de uma fala da psicóloga Marie le Blac, que se refere aos profissionais da saúde deixarem sua metodologia pronta de lado para experimentar a experiência proporcionada pela prática. Afinal, as trocas são fornecidas tanto pelos profissionais quanto pelos jovens, que vivenciam essas sensações.

Justamente por se tratar de um processo de troca, durante as oficinas mostradas no curta, casos de jovens que tiveram ereção durante as atividades foram relatados. Ao perguntar sobre a melhor maneira encontrada para lidar com a situação, Ana Maria respondeu:

“Eu trabalho com o contato. Nunca tive problema com isso. Foram duas ou três vezes que um jovem teve uma ereção. A gente pensa que a pessoa deficiente não tem sexualidade. Em países como a Suíça, existem ajudantes sexuais, que são profissionais que lidam com essa questão, ajudando casais a terem uma relação, por exemplo. No Brasil, isso ainda é algo distante. Para mim não, não é um tabu”.

Além da discussão sobre o filme, o encontro trouxe importante reflexão sobre o lugar de escuta dentro da arte, uma vez que corpo, dança e fala também são ferramentas. Durante o filme, pude ver que essas ferramentas permitem aos jovens se expressarem sobre o mundo. É preciso haver escuta.

O filme “Um passo de lado” pode ser visto neste link:

https://www.youtube.com/watch?v=_L4L2f2lY7g&t=393s

O projeto “Arte e Diferença” tem uma página de mesmo nome no Facebook e está no Instagram com a página @arte.diferenca.

Mundo Autista

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