Selma Sueli Silva e Camila Marques
Selma Sueli e Camila Marques conversam sobre a necessidade da comunicação não violenta para a humanização da sociedade em tempos modernos. Você sabe o que é a CNV – Comunicação não Violenta?
Selma Sueli Silva: Temos falado sobre a comunicação: discurso, mensagem, que é a nossa fonte inspiradora, a nossa energia vital, que é o campo de pesquisa da Camila e do Victor e o meu também, apesar de não ser acadêmica. Nós sabemos nos comunicar? Nossa comunicação agrega, constrói? Esta é uma preocupação que tenho comigo desde que a gente polarizou o discurso. Há um senso comum de que o mineiro “está em cima do muro”, mas não. Não necessariamente da maneira como se pensa. É preciso entender os dois extremos, as duas vertentes, para encontrar o denominador comum ou até o denominador que não seja comum, mas que nos leve a um consenso, que seja bom para todo mundo. Eu não acredito, no terceiro milênio, em regras que dizem que para eu ganhar, você precisa perder. Eu não acredito mais nisso. Eu não acredito, no terceiro milênio, em regra que diz que o errado é que está certo. Não, eu não acredito. Não acredito em “Eu sou esperto, o esperto tem que levar vantagem em tudo”. Não. Porque esse tipo de pensamento é destrutivo. E se destrói, a gente tem que parar para pensar. Há muito tempo que eu adotei uma postura humanista no sentido de que não existe a felicidade para ninguém se não existir a felicidade do outro. Não existe isso de “estar de boa, se o outro não estiver sofrendo”. Não há nada de comunista neste discurso, não há nada disso. É a questão de a vida ser preciosa demais. Todo o ser humano é precioso demais. E a gente tem que fazer a nossa vida valer. Porque se formos olhar em termos de universo, a nossa vida passa em um sopro. Em termos de história, se formos viver 90 anos, 100, 120 anos que seja, que é o que eu quero viver com qualidade de vida, em termos de história, ainda é muito pouco. Por isso, tem que valer a pena. Eu tenho que viver com honra, com dignidade, com coerência. Então, definitivamente, eu não gosto de pessoas extremistas, não gosto de opiniões extremistas. Mas, consigo usar essa palavrinha importante no terceiro milênio, que é a empatia, para tentar entender as pessoas que pensam diferente de mim.
Eu sei que tem gente que já sofreu demais e adotou uma postura extremista até para se defender. Ok, mas vamos parar para conversar, vamos ver aonde vamos chegar. Essa postura está te aproximando do resultado que eu quero? Estamos avançando? Com quais perdas? E o custo-benefício? Vocês perceberam que os políticos em seu discurso, usam, necessariamente, palavras como família, (mesmo que seja um safado), ele diz: “…mas a minha querida mulher, o lar para mim é tudo!”. Usam as palavras Deus, honestidade, e falam de uma suposta preocupação com o crescimento do Brasil. O discurso não pode ser construído em cima de palavras que impactam o imaginário distorcido do povo. Como que a gente se resguarda disso? Temos de cruzar dados, nos informar, ouvir quem pensa diferente e igual a nós. Há pouco tempo, vivemos o 7 de setembro. E, eu nunca pensei que nesta data, já adulta ouviria o presidente da minha nação, enaltecendo o golpe de 1964. Eu vivenciei, na adolescência, o início da abertura pós anos cinzentos, de chumbo, de repressão, de medo.
Eu entendo você, que acredita nisso, mas eu te falo: se você estudar, se você pesquisar, não tem como você continuar pensando assim. Agora, depende da fonte que você vai estudar. Porque você vai achar fonte que vai reforçar a sua ideia. Mas não são fontes fidedignas e se você for cruzando e cruzando informações, você vai chegar à verdade. Então, é muito importante que a gente repense a nossa história para que a gente não ofereça aos nossos filhos os mesmos erros do passado. Que nossos filhos desapareçam, sem nunca mais serem achados porque “alguém” pensou que o nosso filho não seria bom para o país. Por isso temos de reavaliar a polarização do discurso porque mesmo que aquela pessoa defenda a ideia de que não foi golpe, os jornais da época, os livros de história vão nos mostrar que foi sim. Mas se para revidar uma opinião diferente da sua, você usar o mesmo mecanismo do outro, uma linguagem agressiva, um discurso agressivo, um discurso desrespeitoso,você não será diferente dele, daquilo que você critica, embora a essência de sua fala seja verdade.
Temos que nos preocupar com a essência do falamos, mas temos que nos preocupar com a forma, também. Há muito tempo, vem sendo estudada a comunicação não-violenta. Rosenberg Marshall*, que é o pai da Comunicação Não-Violenta (CNV), ele fez uma coisa linda antes de morrer: ele abriu a possibilidade de colocar o livro dele em PDF, e você baixar de maneira gratuita. Então, se você fizer uma pesquisa, você vai achar o livro Comunicação Não-Violenta, de Rosenberg Marshall. Essa comunicação nos lembra que o outro, que pensa muito diferente de mim, é um ser humano como eu. Em que caminho, em que momento da vida dele, ele formou uma visão tão distorcida? Eu tenho que ter empatia para tocar o coração desse cara. Uma comunicação que não respeita e não toca o coração, que desconsidera o outro como ser humano, não é comunicação.
Não há possibilidade de se comunicar se você considerar o outro como adversário, se você considerar o outro um animal não- pensante. Olha aí os dois lados da questão: quem se dirige ao nosso presidente dessa maneira, mesmo discordando dele, e eu também discordo em muitas coisas, mas também não está sendo elemento agregador.
A comunicação é algo muito maior. Comunicação não é despejar tudo o que está me incomodando, tudo o que eu quero melhorar, na cabeça do outro. Comunicação é estudar o que eu quero, saber se essa mensagem faz sentido, saber se ela está próxima ou se é essência da verdade, e como que eu vou atingir ao meu objetivo, chegando e tocando o coração das pessoas. Parece romântico, mas comunicação é isso, não é não, Camila?Camila Marques: É isso sim, Selma. Eu nasci depois do golpe militar, da ditadura e eu fui muito feliz pois pude votar aos 17 anos pela primeira vez. Não há nada é mais bonito do que participar de algo tão importante para o conjunto, como é a política. Hoje, estamos em um contexto que o ex-ministro da educação sucateou as políticas de educação. Aqui eu falo da educação, mas a gente já vinha de congelamentos de gastos na saúde (a aprovação da PEC 55, em 2016, que congelou os gastos em saúde e educação para os próximos 20 anos). Atravessamos agora, o período da pandemia, a questão da saúde pública, onde lidamos com milhares de desafios e o quanto que as decisões equivocadas do Governo nos afeta, embora o Governo tenha anunciado recentemente, a previsão da vacina para o mês de janeiro. O ministro da saúde, Eduardo Pazuello, declarou, no dia 8 de setembro que a vacinação contra a Covid-19 começa em janeiro de 2021, embora ainda estejamos no período dos testes. Aproveito para enviar saudações aos pesquisadores brasileiros que resistem, mesmo com tantos cortes nos investimentos em pesquisa, nessa busca incansável. Embora, o congelamento de gastos com saúde e educação vem desde 2016, as verbas para as universidades federais estão diminuindo desde 2015. Vivemos em um país onde as universidades federais se viram como podem.
A gente sabe que, no Brasil, o SUS – Sistema Único de Saúde é que investe em pesquisa e em pesquisa que chega até as pessoas, através da vacina, das doses dos remédios nos postos de saúde. Aliás, não somente as questões de saúde, porque o SUS é mais amplo, atua também, na vigilância sanitária, distribuição de preservativo e outros. Em média, um teste para o coronavírus custa 300 reais. Nós sabemos que boa parte da população não dispõe desse valor. Quando se fala de políticas públicas, tem de ser de ponta a ponta. Não devem ser políticas apenas para quem mora em bairros com mais acesso não. São políticas para chegar lá nas periferias também. Porque, nas periferias, além da covid chegar e atingir mais pessoas, tem também outras questões. A favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, é a segunda maior da América Latina e ficou sem água sete dias em meio à pandemia. Não se trata apenas de pesquisas para conhecimento teórico, mas sim para que essas pesquisas possam chegar também na periferia.
Eu gosto muito de falar sobre o conhecimento acadêmico, mas se ele não inclui os mais vulneráveis, os mais pobres, o conhecimento não vale. Cuidado com o que vocês leem e pesquisam, o “Ordem e Progresso” da Bandeira Nacional ele não é uma ordem e progresso à base de truculência, não. Sabemos que essa “ordem de cacetete” não educa ninguém. Quando falamos dessa ordem, se trata de uma ordem de alinhamento, uma ordem de alcance. Uma ordem que não deixa ninguém para trás. Aí, como consequência dessa ordem, vem o progresso, que é o avanço. É importante ter cuidado com esse excesso de autoritarismo, com esse discurso, porque esse autoritarismo não chega a todas as pessoas. É um discurso fechado. Ele vale para as populações de periferia.
*Anos de Chumbo- Os anos de chumbo foram o período mais repressivo da ditadura militar no Brasil, correspondendo ao fim de 1968, com a edição do AI-5 em 13/12/1968, até o final do governo Médici, em março de 1974. Alguns estudiosos reservam a expressão “anos de chumbo” especificamente para o governo Médici (1969-1974).
**Marshall Rosemberg- Marshall Bertram Rosenberg, psicólogo americanon (1934-2015).No início dos anos 1970, em sintonia com o movimento dos direitos civis americano, Rosenberg começou a trabalhar como orientador educacional em escolas e universidades que abandonavam a segregação racial. Neste cenário, desenvolveu um método comunicativo chamado Comunicação Não-Violenta (CNV).
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