Autismo

Como lidar com inseguranças no início da vida adulta

Victor Mendonça e Raquel Romano

Victor e Raquel falam sobre as decisões que tomamos na vida e a importância do autoconhecimento para fazer as melhores escolhas.

Victor Mendonça: A brincadeira envolve criança, adulto e idoso. Mas, à medida que crescemos, nos é cobrada uma postura diferente por sermos adultos. E, às vezes, bate uma insegurança que muitos chamam de reação infantil para um adulto. Isso acontece com qualquer pessoa, mas em nós, autistas, é mais frequente e talvez seja mais comum.

Eu me lembro de um caso que eu e a Raquel discutíamos em que eu tive de assinar um contrato para uma publicação literária e aquele contrato simbolizava muito e eu tive uma ansiedade muito forte, porque eu tinha que assinar logo. Acontece que eu não queria assinar, não queria mandar o documento. Meus sentimentos eram muito contraditórios. Ao mesmo tempo que não queria, eu já queria assinar logo, eu queria enviar o documento. Mas eu com insegurança de fazer isso porque o contrato é uma coisa complexa, uma coisa da vida adulta. E, com a gente conversando sobre isso, eu cheguei a conclusão que foi um ato infantil meu que aflorou, talvez inconscientemente e tudo mais. Então, Raquel, o que a gente pode falar para esse adulto autista que, em muitos casos, sente insegurança que é rotulada como infantilidade e que não é adequada para a faixa etária dele, socialmente falando?

Raquel Romano: Olha, essa questão é bem recorrente, quando se refere a uma tarefa nova, quando uma situação é nova. Imagina o exemplo que você deu de ter que assinar um contrato. Então, você sentiu aquilo como uma responsabilidade na vida, uma responsabilidade que pesou como se você estivesse correndo risco. Então, isso é muito próprio das pessoas responsáveis, das pessoas que têm um estilo de pensamento mais lógico. Mas, o que você acha que está acontecendo com essas pessoas? Elas experimentam aquele sentimento de: “eu não sou mais uma criança”. “Eu mesmo sou o dono dos atos.” Por isso, foi muito simbólica essa insegurança, esse medo que você sentiu, Victor. Ele é legítimo. Assinar um contrato, por mais que você leia, significa que você está se assumindo na vida. Esse “assumir-se” diante dos desafios da vida, gera muito medo, gera muita insegurança. E é por isso que nós precisamos de nos apoiarmos uns nos outros. Quando você dividiu esse medo comigo, a gente refletiu, por que será? A gente refletiu e a gente dissolveu aquele medo, pronto!

Viver é desenhar sem borracha”, dizia Millôr Fernandes, muito sabiamente.

A vida nos apresenta cada dia um desafio e tudo vale, não tem como você apagar e falar: “Isso não valeu.Vou passar para a frente para sermos perfeitos”. Nunca seremos perfeitos. E a insegurança é um processo natural. Se você reconhece, que bom. Essa atitude se chama autoconhecimento que é você reconhecer o sentimento que teve. Então, se você está diante de uma responsabilidade nova, que faz você tremer, enfrente, se perceba: “o que me faz ficar com medo? Por que que eu estou com medo?” Aí você vai perceber logo que esse medo, que vem com uma situação nova é natural pois você não é mais uma criança. Você pensa: “sou um adulto e vou ser dono dos meus próprios atos, dono dos meus próprios passos”. E aí, você passa a ver que isso não é um peso, essa responsabilidade é, na verdade, uma oportunidade para o seu crescimento. Claro que sempre contando com o apoio de alguém, dialogando, porque o autoconhecimento depende disso.

O que a gente faz no nosso processo de arteterapia é discutir sobre os sentimentos que brotam, sobre os medos que brotam e trazer atividades que dissolvam esses medos. Você me contou do caso de assinar o contrato. Conversamos sobre isso e pronto, dissolveu. Você resolveu a questão, assinando ou não, o mais importante é a decisão diante daquilo. Isso é um passo a mais para os próximos desafios e faz parte de nosso crescimento. Crescer é desenhar sem borracha, porque você não apaga. Cada situação é uma lição nova na sua vida, que a gente pode levar com leveza, com naturalidade. E não se esqueça, fugir de uma situação é retroceder.

Victor Mendonça: E a gente não quer retroceder. Queremos caminhar para a frente, sempre. Uma coisa que você disse e que vale a gente analisar é quando você se conhece, você é capaz de identificar e transformar qualquer situação. Isso é muito importante.

Raquel Romano: Importante e acaba com o sofrimento. Vamos ser felizes agora, já!

Mundo Autista

Posts Recentes

A música Firework, de Katy Perry, é um hino budista?

Você sabia que a música Firework, de Katy Perry, é um hino budista? Confira a…

2 horas atrás

Crítica: Enfeitiçados (2024)

Enfeitiçados parte de uma premissa inovadora e tematicamente relevante. O filme traz uma metáfora para…

2 dias atrás

Crítica: A Nonsense Christmas with Sabrina Carpenter

Sophia Mendonça resenha o especial de Natal A Nonsense Christmas with Sabrina Carpenter, com esquetes…

2 dias atrás

O autismo na série Geek Girl

O autismo na série Geek Girl, uma adaptação da Netflix para os livros de Holly…

4 dias atrás

Crítica: Os Fantasmas Ainda Se Divertem (2024)

Os Fantasmas Ainda se Divertem funciona bem como uma fan service ancorada na nostalgia relacionada…

4 dias atrás

Crítica: Ainda Estou Aqui (2024)

Ainda Estou Aqui, com Fernanda Torres, recebeu duas indicações ao Globo de Ouro e está…

7 dias atrás

Thank you for trying AMP!

We have no ad to show to you!