Selma Sueli Silva e dr Luís Renato Arêas
O doutor Luís Renato Arêas falou recentemente, sobre como garantir a assistência para pessoas com deficiência no SUS. Você já teve problemas com planos de saúde? Consegue todos os atendimentos que sua família necessita? Se você respondeu não a uma dessas perguntas, confira como garantir atendimento adequado.
Selma Sueli Silva: Hoje, vamos falar de um assunto que, para mim, acaba sendo um pouco espinhoso porque muitas mães me procuram para saber como deve ser a a atuação dos planos de saúde nos casos do atendimento a pessoas com deficiência – PcDs. Como que a gente pode garantir para os nossos filhos, a nossa família, o atendimento adequado dos planos de saúde que a gente contratou?
Dr. Luís Renato Arêas: Essa não é uma discussão recente. Eu vou trazer toda a experiência do autismo porque é uma deficiência não aparente e tem toda uma complexidade. Talvez, seja um segmento das pessoas com deficiência que sofrem muito com essa questão dos planos de saúde. Primeiramente, o Transtorno do Espectro Autista (TEA) é um espectro, logo, demanda por várias terapias, de acordo com a necessidade de cada pessoa. Inicialmente, a gente via uma demanda imensa dos planos de saúde para fornecer, por exemplo, o Tratamento ABA**, que é um tratamento muito importante no caso do autismo, pois trabalha as repetições, autonomia e desenvolvimento da criança com autismo. O que acontece: esses planos negavam o tratamento ABA com o fundamento de que não está no hall de atendimento da Agência Nacional de Saúde (ANS). E, é um pouco similar ao que já falamos aqui, sobre o uso do SUS. A lista da Agência Nacional de Saúde é uma lista mínima, ela não abarca todos os procedimentos e todos os tratamentos. Quem vai saber da necessidade, volto a dizer, é o médico.
A exemplo do que nós falamos quando tratamos da educação, sobre o TDI, o Plano Individual de Desenvolvimento, nós temos que ter também o plano individual de saúde, principalmente no caso do autismo, porque é muito diferente dependendo do autismo, do espectro. Esse médico vai saber qual é a terapia mais adequada e a sua periodicidade. Cabe ao médico trazer essas questões, não ao plano. Ao contrário, o plano às vezes quer padronizar e você sabe que padronizar é uma palavra inimiga, principalmente do autismo. Se tem uma coisa que não tem nada a ver com o autismo, com a pessoa com deficiência, mas com o autismo ainda mais, é exatamente a padronização, porque o autismo é um espectro, com muitas variações. Eles inviabilizavam o tratamento ABA e, nesse sentido, nós temos várias decisões judiciais já favoráveis ao consumidor, favoráveis a pessoa, para que o plano de saúde tenha a cobertura do ABA. Também da mesma forma, a gente tem dificuldades com outras terapias. Temos por exemplo, a terapia ocupacional, o fonoaudiólogo. Às vezes, o plano autoriza uma quantidade determinada de sessões, e às vezes, você precisa da sessão toda semana, dependendo do caso. Por exemplo, a fisioterapia: você contrata as dez sessões e você tem necessidade de cumprir todas as sessões, é uma sequência. A continuidade no autismo é muito importante e para outras deficiências também. Às vezes, o plano não negava, mas colocava um terapeuta ocupacional uma vez por mês, uma vez a cada dois meses. Ou, aquele terapeuta que o plano fornecia não era especializado no assunto, não sabia muito sobre o autismo. Então, se tem que ser um atendimento especializado, o médico tem que colocar isso no pedido.
É bom que se tenha isso no relatório médico, tem que ser muito bem feito, tem que ser pormenorizado, porque precisa ter a necessidade da periodicidade, se precisar de um terapeuta específico, tudo isso deve vir detalhado no pedido para resguardar esses direitos das pessoas, nesse atendimento humanizado que, na maioria dos casos, é necessário judicializar, infelizmente. Nesse caso, é bom procurar a Defensoria, o Ministério Público e um advogado de confiança. Mas, uma vez judicializada, a pessoa pode cobrar do plano de saúde o que ela já gastou com tratamento particular, com as terapias que o plano não cobriu. Além de indenização por dano moral ou dano material, desde que existentes os vínculos dessas indenizações. É importante que o cidadão saiba onde recorrer e acabar com essa ideia de padronização que os planos têm. O plano não pode padronizar. É um direito à saúde, garantido por lei.
Essa é uma relação de consumo. Isso já está sedimentado, cristalino na jurisprudência, nas decisões e não se discute. Quando você vai assinar um plano de saúde, você vai assinar o termo de adesão que a gente fala. Adesão porque, ou você entra ou você não entra. Então, ou você assina o que já está lá impresso ou então, você não tem o plano de saúde. Eles não te dão opção. Para mim, que sou um operador do direito, é um suplício, porque 90% das coisas que eu assino, é ilegal que, às vezes, a gente vê nas relações com o consumidor. Logo, o plano de saúde vai ter isso também e vai afirmar: “Mas você assinou isso aqui.” Só que é ilegal, é abusivo, fiquem tranquilos, porque não é o fato de que você assinou que faz aquilo valer. Dentro dos Direitos do Consumidor, as cláusulas devem ser interpretadas de forma favorável ao consumidor. Mesmo que esteja expressa qualquer situação que restrinja esses direitos de terapia, isso é ilegal. Levando ao judiciário, tudo é resolvido e, acredito eu, que o tratamento vai ser fornecido desde que a gente tenha essa prova bem produzida, com relatório médico bem feito, bem realizado.
E só fazendo uma observação: a gente está falando de plano de saúde, mas também se aplica para redes do SUS. Se a pessoa precisar e não tiver um plano, mas precisa de uma terapia ocupacional com a regularidade de duas vezes na semana, ela tem de conseguir mesmo que tenha de lutar por isso. Dependendo do município que você resida, enfim, até mesmo os municípios maiores, é um direito seu e você pode procurar, você pode judicializar com a documentação correta, comprobatória. Eu acredito que a justiça não vá se pronunciar de forma contrária a esse direito. Tem muita decisão já favorável, por isso que eu digo que acredito. Basta pesquisarem na internet. Então vale para a rede do SUS também. Tanto trabalho do ABA, da terapia ocupacional, ou os outros tratamentos médicos.
Hoje, uma das modalidades que é a equoterapia, com cavalo, já é regulamentada. Nós temos lei 13.830, que estipula a equoterapia como tratamento reconhecido. Então, os planos devem cobrir isso também. Por que estou dizendo isso? Porque eu coloquei meu filho na equoterapia. E, para mim, está sendo fantástico no autismo do Rafael (filho mais novo do doutor Renato). Se o plano não fornece, ele é obrigado a abarcar e a contratar a pessoa adequada para esse tratamento. Isso é aplicado também para a rede do SUS.
Tratamento ABA* – A análise do comportamento aplicada, ou ABA (Applied Behavior Analysis, na sigla em inglês) é uma abordagem da psicologia que é usada para a compreensão do comportamento da criança e vem sendo amplamente utilizada no atendimento a pessoas com autismo.
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