Em primeiro lugar, confesso. Escrevo sob efeito do encantamento. Aliás, ainda estou emocionada. E, claro, estou também, impactada pelo (re)encontro com Clarice Lispector e as diferenças e igualdades humanas. Em segundo lugar, explico: eu assisti ao espetáculo lítero-teatral online, “Na sala com Clarice”. Ele foi idealizado e interpretado, brilhantemente, pelo ator Odilon Esteves.
O cenário é a sala do apartamento do artista mineiro, onde mora, em São Paulo. Nela, Odilon oferece ao espectador, a oportunidade de escolher quais textos deseja conhecer. Ou seja, é uma experiência interativa, sonora e visual. Nela, votamos, eletronicamente, a partir de uma espécie de menu. Dessa forma, Odilon nos convida para um jantar com a arte literária. E, no cardápio, contos e crônicas de Clarice.
É assim que, desde a entrada até o cafezinho ao final, o anfitrião harmoniza os diferentes textos da autora. Aliás, textos cuidadosamente pinçados de livros distintos de Clarice. Por exemplo, “Via Crucis”, “A descoberta do mundo”,“Pra não esquecer” e “Felicidade Clandestina” são alguns deles.
Certamente, a linguagem da autora tem reverberado em mim. Aliás, reverberado de forma avassaladora. Para falar a verdade, o que sinto é que estive em um banquete literário. Como leitora e espectadora. A percepção de Clarice era à frente do seu tempo. Portanto, é essa percepção que torna sua obra atual. Ou seja, acessível ao público de hoje. Fico impressionada como a escrita dela é atemporal!
Estar face a face com Clarice Lispector sempre despertou em mim um derramamento de sentimentos. E é nesse transbordar que vou me descobrindo. E, assim, me autoconheço. A humanidade de suas palavras me traduzem, à mim mesma.
Então, sinto-me conectada a ela, por meio de sua escrita. Até queria ter sido sua contemporânea. Mas, infelizmente, Clarice faleceu no ano em que eu nasci.
Foi exatamente em 1977, que ela escreveu seu último livro: “A Hora da Estrela”. Quando o li, experienciei a estética da epifania! Uma sensação profunda de realização. Realização no sentido de compreender a essência das coisas.
Entretanto, tive muita dificuldade durante a leitura. Fiquei incomodada em diversos momentos. Principalmente, com a escrita do narrador, o Rodrigo S.M. Talvez pelo o quanto o olhar dele retrata o nosso próprio olhar, em sociedade.
Por esta lente, penso que Clarice se projetou como interlocutor masculino. Talvez, ela quisesse demonstrar como a nossa visão foi moldada. Isso mesmo. Moldada em uma sociedade opressora, injusta, autoritária. Além de patriarcal, capacitista, machista e racista. Clarice Lispector nos escancara as diferenças e igualdades humanas.
Enfim, para conhecer as diferentes opções da obra da escritora e jornalista, ainda há duas chances. Você também, pode saborear o jantar literário na companhia de Odilon Esteves. As últimas sessões da temporada vão acontecer nos dias 20 e 27 de novembro, às 20 horas. Basta adquirir o ingresso pelo Sympla, clicando aqui.
Outra oportunidade de constatar o brilho multifacetado da autora, é a exposição “Constelação Clarice”, no Instituto Moreira Salles em São Paulo. Quem passar pela Avenida Paulista, terá o privilégio de apreciar manuscritos, cartas, fotografias e muito mais.
“Uma singular história da arte brasileira é assim conjugada no feminino, com obras que só o universo literário de Clarice permite reunir…”. Até fevereiro de 2022, aproveitemos, pois, sem moderação!
Roberta Colen Linhares, natural de Belo Horizonte – MG, casada, mãe de Arthur e Isis, contadora de histórias pelo Instituto Aletria, e atualmente é graduanda do Curso de Letras na PUC Minas.
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