O Mundo Autista

Autismo e Mercado de Trabalho

Victor Mendonça e Selma Sueli Silva

Dia do Trabalho. Adoramos trabalhar. Qual é a maior preocupação da família que tem um autista? Meu filho vai se sustentar, vai produzir, vai arranjar emprego… Se bem que esse negócio de arranjar emprego já está um pouco ultrapassado, a gente está numa fase em que muitas pessoas querem empreender e conseguem até empreender com sucesso.

Primeiro, existe lei? Existe. Existe lei de cotas. Toda empresa tem que ter um percentual para pessoas com deficiência. O autista se enquadra nessa lei de pessoas com deficiência. Então, ele tem direito a essa cota. Mas em qual setor? Aí é que hoje é o Dia do Trabalho, mas vamos chamar a atenção dos empregadores, dos empresários. Eles normalmente acham que a pessoa com deficiência é um profissional ineficiente, incapaz. E aí, às vezes ele está com autista com altas habilidades – ou um autista moderado que é fera em Informática – quer colocar esse cara (ou essa menina) empacotando. Aí ele não tem habilidade, por causa do Transtorno do Processamento Sensorial, de sistematizar, algo que ele deveria trabalhar com uma TO.

Convidamos os empregadores a conhecer melhor as associações, a conhecer melhor esse fascinante universo diversificado, a pessoa com Síndrome de Down, a pessoa autista, a pessoa com Paralisia Cerebral. Ainda mais na Paralisia Cerebral, onde é pior ainda. Porque, o nosso cérebro, na maioria das vezes, quando pega uma pessoa com dificuldades na comunicação, vai achar que a pessoa não entende nada, não sabe e não, ela tem dificuldades nessa comunicação, mas o cérebro está ali, “danado de bom”.

A gente tem pré-conceitos (não é nem preconceitos, é com hífen mesmo) ao ver as pessoas. A gente se lembra de uma pessoa ter visto uma palestra de um vereador por vários mandatos, Gleissinho, de que quem somos muito fãs. Ele criou tecnologias assistivas para pessoas com deficiência e quando ele fala, ele fala com intérprete, ele tem uma dificuldade na fala, na movimentação, e você não vê o potencial que está dentro dele.

No livro “Neurodivergentes”, de Victor Mendonça, a Fernanda Santana que é uma autista e presidente da ABRAÇA, cita Stephen Hawkings, que era aquele físico renomado que se comunicava pelo computador. Imagine que sem a comunicação alternativa, como a gente saberia como ele podia contribuir para o universo, como ele era inteligente, como ele era sábio, como ele mudou a vida de várias pessoas.

Percebam, neste dia do trabalho, que a limitação está na sociedade, está em nós. A gente tem que conhecer (mais informação, menos preconceito) porque a gente está tendo mão de obra valiosa sendo desperdiçada. Isso a gente está falando de empresas e empresários, mas e quando a própria família não acredita, quando a própria família não investe, protege demais. Tudo começa na família.

Não tem jeito de colocar o nosso filho, a nossa filha, em um molde e falar: ‘vai formar com tantos anos’, ‘vai fazer isso com tanto’, a gente é convidado a cada nascimento a acompanhar o desabrochar de um ser humano. Quando você acompanha com olhos naquele ser humano, você vai percebendo e investindo onde tem que investir também.

Então, hoje, no dia do Trabalho, a gente vai mandar um abraço para todos os trabalhadores e convidar vocês a conhecerem o mundo da diversidade, o mundo da neurodiversidade, porque o nosso país pode ter aumento de PIB. Victor até se lembrou de um exemplo de uma pessoa da nossa família – a avó dele – que ela pode se encaixar hoje no que chamamos de fenótipo ampliado, ela tem traços muito fortes do autismo, mais fortes do que a sociedade em geral, mas ela não chega a ser autista (pelo menos não que a gente saiba, temos a nossa desconfiança). Ela se formou já mais velha em Direito. Na realidade, não houve essa limitação por uma série de fatores. Ela apostou, ela estudou, ela foi, ela sofreu e ela venceu.

Assim somos todos nós. Autistas, neurodivergentes por algum motivo ou típicos. Todos temos o nosso tempo – citamos o exemplo da avó porque ela teve um tempo diferente para concluir as coisas – mas que nós podemos ter o nosso potencial revelado e contribuir positivamente para a melhora do país, para a renda do país e para a transformação d euma sociedade melhor, porque o trabalho dignifica a gente, é uma coisa muito diferente.

Feliz dia do trabalhador, grande abraço a essa nação que ergue um país por meio do suor – não no sentido de esforço, de sofrimento – esse suor que dá prazer na gente de fazer o que a gente faz. A gente ama o que a gente faz!

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.

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