O autismo e a dificuldade na comunicação é tema sério. Tive o diagnóstico de autismo, há 5 anos. Foi libertador. Além disso, entendi muitos episódios em minha vida. Desde criança, não entendia as pessoas. Ou seja, nessa relação eu tentava acertar e estava sempre devendo. Não me fazia entender. Ademais, eu não entendia o outro.
Aos, 19 anos, me apaixonei por um colega de trabalho. No entanto, foram dias terríveis. Eu estava muito apaixonada por alguém que eu não entendia. E mais, enfrentava o pior momento de minha vida. Tentava, inutilmente, entender a linguagem do mercado de trabalho. Desse modo, quase enlouqueci. As pessoas falavam uma coisa, exigiam como resposta outra bem diferente.
Aliás, era comum dizer uma coisa e esperar que a gente entendesse o que não havia sido expressado. Além disso, os colegas e líderes exigiam que eu entendesse o que eles não falaram. O que estava nas entrelinhas. Ora, eu quase não entendia o que estava nas linhas. Que dirá nas entrelinhas. Povo complicado esse do mercado de trabalho.
As limitações da comunicação incluem déficits na linguagem, na fala e na comunicação. A linguagem é todo sistema verbal e não verbal pré-estabelecido que nos permite a realização da comunicação.
A fala é a linguagem oral. É um ato singular, pois cada indivíduo escolhe as variedades da língua para exposição da fala. Conforme o momento, o contexto, sua personalidade, o ambiente sociocultural que está inserido.
Comunicação inclui todo comportamento verbal e não verbal que influencia o comportamento, as ideias ou as atitudes de outro indivíduo. Por isso, optei pelo curso de Comunicação Social. Ou seja, me dei conta do quão complexo é se comunicar com o outro.
Os cursos de Relações Públicas e de Jornalismo me ofereceram ferramentas. Assim pude lidar com minha dificuldade em me comunicar. Mas foi o autismo que explicou minha deficiência na comunicação. Eu não entendia a linguagem corporal. Passei a me abrir, tentar tocar o coração do outro para que as expressões dele fossem mais acentuadas. Dessa forma, eu aumentava a minha chance de percepção.
Entretanto, eu me conectava pela via do afeto com todas as pessoas. Todas elas. Não havia separação entre familiares, relacionamentos profissionais, colegas e amigos. Isso era muito exaustivo.
Por exemplo, ao terminar uma reunião religiosa, familiar ou de trabalho, eu me despedia de um por um. Não queria comunicar que quem estivesse longe de mim fosse menos importante. Demandava tempo e esforço. O modo cansado era constante em minha vida.
Passados 5 anos de meu diagnóstico, ainda tento me ‘enquadrar’. Foram anos e anos tentando parecer ‘normal’ para me enquadrar e ser aceita socialmente.
Perceber a perplexidade de um profissional de saúde ao perceber meu interesse à pessoa dele para além do profissional, é constrangedor. Quisera já saber separar os vários tipos de relação. Contudo, ainda não consigo. E sofro com o distanciamento imposto pelos diferentes níveis de relacionamentos.
Ouvir alguém comentar que um colega apostou que eu estava interessada nele, me irrita e confunde. O argumento é que fui muito amável durante um diálogo qualquer.
Esconder algumas opiniões de determinado grupo para não ser julgada com a régua da normalidade, exige uma atenção constante. Levantar para mais um dia, claro, é prazeroso. Todavia, me exige um esforço imenso na comunicação. Ou seja, nessa troca social. E é aí que eu pergunto: Somos seres humanos sociais. Cada qual com suas características. É certo somente o neurodiverso se esforçar para manter as relações sociais? A memória retesada de meus músculos e as dores pelo corpo me dizem que não!
Selma Sueli Silva é autista, jornalista e escritora.
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