Selma Sueli Silva e Dra. Ângela Mathylde Soares
Selma: Dra. Ângela, muito obrigada, vamos que vamos. O internauta Nilton Azevedo quer saber como lidar com crianças com crises de choro, birra, desespero, em ambientes barulhentos e iluminados…
Dra. Ângela: Muito obrigada pela pergunta, é um prazer estar aqui com você, Selma. Um grande abraço para o Victor.
Selma: A gente dividiu, viu gente? Depois o Victor volta.
Dra. Ângela: Isso mesmo; tem que voltar, ele é lindo e maravilhoso. Amo o Victor. Parabéns novamente pelo mestrado. Continue assim. E que todas as pessoas possam entender esse dinamismo da Selma e do Victor. São autistas, nós sabemos do andar da Selma, da categoria profissional e também do Victor. Quanto à pergunta do nosso amigo, como superar todas essas coisas?
Todos nós, a primeira coisa além da patologia, nós temos que considerar que tem que tem um start. Alguma coisa que nos leve a padrões aceitáveis. Como fazer isso? Você perguntou sobre as birras e essas coisas todas. Depende da idade, as birras são naturais, e se é natural você tem que educar esse serzinho lindo e maravilhoso para que ele se adeque à educação que você sonhou para ele.
Nós não podemos esquecer que tem determinados momentos, de zero a dois anos, que o cérebro é infantil, ele luta por uma questão simbiótica de vida. Então, assim, tudo é meu. Tudo é propriedade dele.
Selma: Bons tempos…
Dra. Ângela: Sendo assim, como temos que trabalhar? Temos que começar a socializar esse indivíduo. Nesse primeiro momento nós permitimos porque ele ainda está aprendendo, mas nós não podemos esquecer que eles são uma esponja. É o momento em que eles mais aprendem, por isso temos que aproveitar, é o que nós chamamos de “Janelas de Oportunidades”. Temos que investir nesse momento.
Em outro momento, 4 a 6 anos, ele começa a perceber que tem um breque, tem um “não”. Não é tudo seu; não pode. O cérebro vai buscar outra situação, mais límbica, desejo e afeto. E ao mesmo tempo em que quer autonomia, não tem maturidade para isso. “Você faz isso?” “Não”. “Pega aquilo?” “Não”.
Ou então, fica vítima, faz pirraça. Tem até crianças nessa fase que falam: “Não gosta de mim eu não quero conversar com você mais”.
Selma: Mas, como para o autismo tudo é mais intenso, alguns falam “Eu te odeio”.
Dra. Ângela: E por quê? A intensidade é maior. Nós temos que lembrar que no TEA, tudo é muito intenso. Por quê? Pois a capacidade de socialização é mais voltada para uma restrição. Quando eu tenho isso muito bem elaborado, eu falo “Não, sai, pronto, acabou”. Mas como o autista tem essa dificuldade, tudo fica muito intenso, pois não tem essa flexibilidade cognitiva. O outro dá um jeitinho. Mas no autismo não.
No autismo, a birra significa algo está incomodando. Então, é hora de ficar alerta a esse algo que está incomodando. Depois que descobrir, vamos mediar isso, se é muito ruído, muita estimulação, muita informação. Esse cérebro está caminhando, do mesmo jeito que o outro, só que existe ainda um complemento. No autismo, por exemplo, nós temos muita dificuldade no processamento auditivo, muito ruído, muito som, traz problema.
É muita informação, a geladeira, o automóvel, mamãe falando, papai falando, televisão ligada. E como eu vou focar nessas informações se o meu processamento tem dificuldade?
Selma: É um desafio.
Dra. Ângela: As pessoas acham que isso é normal, porque para elas é normal, pois sabem diferenciar sons. Mas quem não sabe, é difícil.
A questão do toque quando está fazendo pirraça, eu quero abraçar. Muitas vezes isso vai incomodar, pois toque para o TEA é muito difícil e tem que ser permitido. É isso que nós temos que entender, até para ser contido o autista tem que te dar permissão. E você tem que ganhar essa permissão dele, o afeto para isso acontecer e quando isso acontece, um gesto, um olhar, já demonstra para ele que você está ali com ele e que pode acalmar. E às vezes, quando não quer acalmar, você tem que sair do campo visual dele, deixar que ele mesmo dê conta desse processo. Isso que é a questão da própria regulação. Tem alguns que precisam pular, porque isso trás para ele confiança. Tem outros que precisam movimentar-se, andar, conversar, em todas essas questões, e vamos respeitar, pois é uma forma que essa pessoa descobriu para se acalmar e se controlar.
Selma: Tem uma coisa que eu gosto na vinda do autista para esse mundo. Ele veio para a gente refletir, porque isso tudo que a Dra. Ângela acabou de falar brilhantemente significa: observe seu filho, o enxergue como ser humano, se coloque no lugar dele, ele irá te dar as pistas.
Dra. Ângela: Você falou tudo. É a permissão. Dar permissão. Precisamos entender isso e quando essa permissão vem. Ele gosta muito de brinquedos, nos já falamos sobre isso no programa de hiperfoco: sente do lado, comece a mediar, jogar junto. Assim, é atender a essas pistas, pois elas são fundamentais para o tratamento e o relacionamento.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.