Algo que me preocupa muito é a relação entre autismo, ciência e pseudociência. Isso porque vivemos um momento histórico peculiar no que se refere às investigações científicas. Ou seja, ao mesmo tempo em que há um aumento na divulgação de pseudociências, ocorre também um crescimento da visão positivista sobre a ciência.
Porém, ambas as perspectivas são perigosas para a saúde dos autistas. Por exemplo, o termo pseudociência ganhou enorme destaque em meio a pandemia da COVID-19. Desse modo, foi até tema de livros aclamados e controversos, como “Que Bobagem”, de Natalia Pastemark.
O que é a pseudociência e porque ela pode ser perigosa?
Esse conceito de pseudociência se refere a um tipo de conhecimento que se apropria de uma linguagem científica, mas não apresenta os mesmos critérios rigorosos que conferem credibilidade à investigação científica. O problema é que, muitas vezes, a pseudociência é vendida como algo realmente científico. Com isso, pode iludir as pessoas e desviá-las de tratamentos efetivos.
Acontece que a ciência também é uma instituição composta por seres humanos, que trazem consigo toda a bagagem cultural de preconceitos para lidar com o desconhecimento. Além disso, a atuação científica encontra-se restrita a uma parcela social geralmente com maior privilégio. Ou seja, os grupos de pessoas que deveriam ser o foco da análise muitas vezes não encontram-se suficientemente representados, o que inclui autistas e diversas outras parcelas da população.
Então, a ciência se constrói com base no senso crítico e questionamento. Isso a torna a opção mais confiável que temos para tudo que se refere à percepção de qualquer fenômeno. Entretanto, até ela pode ser manipulada e divulgada como um produto que sirva ao interesse de determinado grupo.
A linha entre pseudociência e ciência e a importância do senso crítico
Assim, o que hoje se considera ciência amanhã pode ser considerado pseudociência. Este é um processo que a História viu se repetir. Aconteceu, por exemplo, com a astrologia.
O problema é que a credibilidade que os “vendedores de ciência” usam como argumento acaba fazendo com que muitas pessoas, incluindo profissionais da saúde, aceitem passivamente o que é falado por esses gurus. Aliás, tanto os mentores de um discurso pretensamente científico quanto os pseudo-cientistas aproveitam-se da falta de conhecimento da população sobre o método científico. Isso já prejudicou grupos como os homossexuais, porque a homossexualidade era considerada patologia até pouco tempo atrás pelos manuais médicos.
Não se enganem: a ciência é a maior aliada dos autistas. Porém, devemos ter senso crítico para, por exemplo, consultar a formação de pesquisadores no currículo Lattes. Afinal, tem muita gente vendendo gato por lebre.
Autora
Sophia Mendonça é uma jornalista, escritora e pesquisadora brasileira. É mestre em Comunicação, Territorialidades e Vulnerabilidades (UFMG) e doutoranda em Literatura, Cultura e Tradução (UfPel). Em 2016, tornou-se a pessoa mais jovem a receber o Grande Colar do Mérito em Belo Horizonte. Em 2019, ganhou o prêmio de Boas Práticas do programa da União Européia Erasmus+
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