Este artigo explica por que o aumento de diagnósticos de autismo é um sinal de progresso, e não uma epidemia.
Você certamente já ouviu alguém dizer: “hoje em dia, tudo é autismo” ou que o aumento dos diagnósticos de autismo está “virando moda”. Essa ideia se tornou um lugar-comum em muitas conversas. Assim, essas pessoas sugerem que estamos vivendo uma onda de “sobrediagnóstico”.
No entanto, essa percepção, além de ser ofensiva para profissionais e para a própria pessoa autista, é perigosa. Isso porque ela invalida a jornada de quem finalmente encontrou respostas. Além disso, reforça estigmas.
Mas, afinal, se o autismo não está sendo “banalizado”, por que vemos um aumento tão expressivo no número de diagnósticos? A resposta é mais simples e muito mais positiva do que parece.
O primeiro e mais importante ponto a esclarecer é: não estamos vivendo uma epidemia de autismo. Na verdasde, o que estamos vivendo é uma epidemia de informação e reconhecimento.
O aumento no número de diagnósticos se deve a dois fatores principais:
Portanto, o que mudou não foi a incidência do autismo, mas sim nossa capacidade de identificá-lo.
Quando tratamos o aumento de diagnósticos como “banalização”, estamos operando a partir de um viés preconceituoso. E não científico.
Além disso, essa suspeita constante sobre a validade de um diagnóstico é perigosa. Isso porque ela coloca em dúvida o trabalho de profissionais qualificados e, pior, a identidade e a vivência da pessoa autista. Afinal, esse ceticismo não é baseado em dados, mas em uma percepção ultrapassada de como o autismo “deveria ser”.
Quem mais sofre com essa narrativa de “banalização”? Mulheres adultas.
Por décadas, os critérios diagnósticos foram baseados majoritariamente em estudos com meninos. Isso tornou mulheres autistas, especialmente aquelas com habilidades sociais funcionais (muitas vezes desenvolvidas através do “masking” ou mascaramento social), praticamente invisíveis para a ciência.
Os dados e elementos que temos hoje são suficientes para confirmar: sim, existem inúmeras mulheres autistas que passaram a vida inteira sem o diagnóstico correto. Portanto, o aumento de diagnósticos em mulheres adultas não é “moda”; é uma correção histórica tardia. Duvidar disso é perpetuar um erro científico que causou imenso sofrimento.
Mudar uma crença popular é difícil. É como a superstição de que um chinelo virado pode matar sua mãe. Racionalmente, você sabe que não é verdade, mas a crença popular é tão forte que ver o chinelo daquele jeito ainda gera um desconforto.
O mesmo acontece com o autismo. Afinal, a imagem antiga e estereotipada do autista ainda está tão enraizada no imaginário popular que, quando a realidade (um espectro diverso, com adultos funcionais, mulheres, etc.) se apresenta, ela causa estranheza.
O aumento de diagnósticos de autismo não é um sinal de banalização, mas sim de progresso. Significa que mais pessoas estão tendo acesso a respostas, compreensão e ao suporte de que precisam para viverem vidas mais autênticas.
Invalidar essa jornada sob o pretexto de “sobrediagnóstico” é faltar com a ética do cuidado. Por isso, precisamos abandonar os velhos preconceitos e abraçar o conhecimento científico atual. O que está em jogo não é uma estatística, mas a dignidade e a saúde mental de milhares de pessoas.
Sophia Mendonça é jornalista, professora universitária e escritora. Além disso, é mestre em Comunicação, Territorialidades e Vulnerabilidades (UFMG) e doutoranda em Literatura, Cultura e Tradução (UFPel). Idealizadora da mentoria “Conexão Raiz”. Ela também ministrou aulas de “Tópicos em Produção de Texto: Crítica de Cinema “na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), junto ao professor Nísio Teixeira. Além disso, Sophia dá aulas de “Literatura Brasileira Contemporânea “na Universidade Federal de Pelotas (UfPel), com ênfase em neurodiversidade e questões de gênero.
Atualmente, Sophia é youtuber do canal “Mundo Autista”, crítica de cinema no “Portal UAI” e repórter da “Revista Autismo“. Aliás, ela atua como criadora de conteúdo desde 2009, quando estreou como crítica de cinema, colaborando com o site Cineplayers!. Também, é formada nos cursos “Teoria, Linguagem e Crítica Cinematográfica” (2020) e “A Arte do FIlme” (2018), do professor Pablo Villaça. Além disso, é autora de livros-reportagens como “Neurodivergentes” (2019), “Ikeda” (2020) e “Metamorfoses” (2023). Na ficção, escreveu obras como “Danielle, asperger” (2016) e “A Influenciadora e o Crítico” (2025).
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Sophia, acompanho o seu trabalho há algum tempo. Vi pesquisas sérias que falam do aumento dos casos de autismo com o uso de determinados agrotóxicos, penso que é necessário aprofundar esses estudos, pois me parece que estão querendo salvar a imagem de algumas empresas. Meu filho é autista nível I, tem 12 anos.
Estude sobre autismo, busque conhecimento!! Autismo sempre existiu, não havia tanto conhecimento como temos agora. Autismo é um transtorno neurológico, não tem nada a ver com agrotóxicos ou vacinas, estude, pesquise, se informe!! Eu sou autista e tenho dois filhos com autismo.
Não há progresso nenhum nem epidemia. O que há é um hiperdiagnostico, isto sim.
Você estuda sobre autismo para fazer essa afirmação tão ignorante?? Mas respeito por favor!!