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A transição social de pessoas trans

Agora sim. Com nome e sexo corrigidos, minha filha iniciou a transição social. Mas como funciona a transição social de pessoas trans? Por onde começar? Minha filha, certamente, iniciou acompanhada por um psiquiatra e pelo endocrinologista. Aliás, o acompanhamento é feito até hoje pelo endócrino, Dr. Eduardo Mundim e pelo psiquiatra Dr. Miguel de Castro Santos.

Então, para quem se interessa pelo assunto é bom ler e acessar a Politica Nacional de Saúde Integral LGBTI do Ministério da Saúde e a própria portaria que instituiu o processo de transição do SUS. Assim como a atualização do CID-11 que excluiu as identidades trans como patologia.

Em 2006, o SUS introduziu, por meio da Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde, o direito ao uso do nome social, pelo qual travestis e transexuais se identificam e escolhem ser chamados socialmente – e não apenas nos serviços especializados que já os acolhem, mas em qualquer outro da rede pública de saúde.

O Processo de transição foi instituído em 2008, passando a permitir o acesso a procedimentos com hormônios, cirurgias de modificação corporal e genital, assim como acompanhamento multiprofissional. Entretanto, o programa foi redefinido e ampliado pela Portaria 2803/2013, passando a incorporar como usuários do processo de transição do SUS os homens trans e as travestis. Ou seja, até então apenas as mulheres trans eram assistidas pelo serviço.

O nome na transição social

O direito de pedir para atualizar o cadastro com o nome social existe e ele tem que ser garantido pelo SUS. Aliás, juridicamente, está sancionado desde 2009 por meio da Portaria nº 1.820 que estabeleceu a Carta Direitos dos Usuários do SUS. Assim, o inciso I do artigo 4º da carta aponta:

Identificação pelo nome e sobrenome civil, devendo existir em todo documento do usuário e usuária um campo para se registrar o nome social, independente do registro civil sendo assegurado o uso do nome de preferência, não podendo ser identificado por número, nome ou código da doença ou outras 14 Conselho Nacional de Saúde formas desrespeitosas ou preconceituosas.

(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012)

Por exemplo, a sociedade precisa saber desse processo do SUS que é um importante avanço na universalização para a população trans brasileira. Afinal, foi uma grande conquista dos movimentos sociais. Contudo, a efetivação desse programa ainda apresenta desafios para gestores e trabalhadores do SUS. Mas, em especial para a população Trans, já que limita – e muito – os serviços e o acesso a maior parte de pessoas trans.

Como funciona o serviço pelo SUS

O cuidado com a população trans é estruturado por dois componentes: a Atenção Básica e a Atenção Especializada. Então, a Básica refere-se à rede responsável pelo primeiro contato com o sistema de saúde, pelas avaliações médicas e encaminhamentos para tratamentos e áreas médicas mais específicas e individualizadas.

A Especializada divide-se em duas modalidades: a ambulatorial (acompanhamento psicoterápico e hormônios) e a hospitalar (realização de cirurgias de modificação corporal e acompanhamento pre e pós-operatório).

Como conseguir atendimento para transição social de pessoas trans

Para todas as pessoas, a idade mínima para procedimentos ambulatoriais é de 18 anos. Para os hospitalares, ela aumenta para 21 anos. Aliás, todo cidadão tem direito de acessar o Sistema de Saúde Público. Assim, o atendimento deve ser humanizado, acolhedor e livre de discriminação.

Até agora, os únicos hospitais liberados pelo Ministério da Saúde para realizar cirurgias de transgenitalização pelo SUS são o Hospital das Clínicas de Porto Alegre, o HC da Universidade Federal de Goiás, em Goiânia, o HC da Universidade Federal de Pernambuco, em Recife, o HC da Universidade de São Paulo e o Hospital Universitário Pedro Ernesto, no Rio de Janeiro. Apenas três unidades fazem acompanhamento preventivo, com foco em crianças e adolescentes de 3 a 17 anos. Uma das unidades está na capital de São Paulo; outra, em Campinas; e a terceira, em Porto Alegre.

Para ter acesso aos serviços do SUS, é preciso solicitar encaminhamento na unidade básica de saúde mais próxima da própria residência. Os procedimentos mais procurados são o tratamento com hormônios, seguidos de implantes de próteses mamárias e cirurgia genital em travestis e mulheres trans. Além desses, ainda, a mastectomia e histerectomia no caso dos homens trans. A faloplastia ainda é feita em caráter experimental no Brasil.

Infelizmente, as filas de acesso variam em mais de 10 anos para a redesignação sexual, e buscar informações sobre os procedimentos necessários para acesso a tratamento fora de domicílio (TFD) pelo SUS, para aquelas pessoas que moram em cidades onde não hajam serviços especializados.

A transição social de pessoas trans em Belo Horizonte:

Ambulatório de atenção especializada no Processo Transexualizador do Hospital Eduardo de Menezes
Primeiro ambulatório para atendimento à população trans pelo SUS em BH completa 2 anos
O atendimento é feito no Hospital Eduardo de Menezes. Atualmente, o ambulatório atende a 500 usuários, moradores de 53 cidades mineiras.
Serviço
As consultas podem ser agendadas no primeiro dia útil do mês, pelo fone: 3328-5055. Ligue cedo e insista! O Hospital Eduardo de Menezes fica na Rua Doutor Cristiano Rezende 2213, bairro Bonsucesso, em Belo Horizonte.
Para mais informações: clique aqui.
Belo Horizonte/MG

Requisitos básicos para acesso à transição social de pessoas trans:

  • Maior de 18 anos para iniciar processo terapêutico e realizar hormonização; *
  • Maior de 21 anos para cirurgias de redesignação sexual, com indicação médica; e **
  • Necessidade de avaliações psicológicas e psiquiátricas durante um período de 2 anos, com acompanhamentos e diagnóstico final que pode encaminhar ou não a paciente para a cirurgia tão aguardada. ***
  • * e ** esses critérios não existem para a rede privada
  • *** Para a rede privada esse tempo passa para 1 ano.

IMPORTANTE: A cirurgia plástica e reconstrutiva da genitália externa, interna e caracteres sexuais secundários não constitui crime de mutilação previsto no artigo 129 do código penal brasileiro, haja vista que tem o propósito terapêutico (RESOLUÇÃO CFM nº 1.652/2002)

Desde junho deste 2019, a transexualidade não está mais na lista de doenças da Organização Mundial de Saúde (OMS). Segundo a entidade, a transexualidade passa a integrar como “incongruência de gênero” a categoria denominada “condições relativas à saúde sexual”.

Principais alterações na Resolução 2265/2019 do Conselho Federal de Medicina, que dispõe sobre o cuidado específico à pessoa transgênero:

• A adoção da nomenclatura médica da transexualidade como “incongruência de gênero” nos termos da atualização da CID feita pela OMS em junho de 2018;
• A previsão do Projeto Terapêutica Singular (PTS) que servirá para elaborar o conjunto de propostas terapêuticas articuladas do paciente, que deve ser objeto de discussão coletiva da equipe multiprofissional e interdisciplinar com participação de cada indivíduo e de seus responsáveis legais; .
• Para crianças e adolescentes na pré-puberdade: previsão somente do acolhimento e do acompanhamento por equipe multiprofissional e interdisciplinar; .
• Para crianças e adolescentes em puberdade: previsão da possibilidade de bloqueio hormonal que consiste na interrupção da produção de hormônios sexuais, impedindo o desenvolvimento de caracteres sexuais secundários do sexo biológico. Prática condicionada à anuência da equipe multiprofissional e do responsável legal do paciente;
• Para adolescentes a partir dos 16 anos: previsão da possibilidade da hormonoterapia cruzada que é a reposição hormonal na qual os hormônios sexuais e outros medicamentos são administrados nas pessoas trans para desenvolverem a feminização ou masculinização de acordo com a sua identidade de gênero. Prática condicionada à anuência da equipe multiprofissional e do responsável legal do paciente;

• Previsão de realização de procedimento cirúrgico somente a partir dos 18 anos e com acompanhamento prévio mínimo de 01 ano por equipe multiprofissional e interdisciplinar; e .
• Avanço na cirurgia de metoidioplastia para homens trans que deixa de ter caráter experimental.

Contudo, não houve atualização da portaria do SUS. Os requisitos permanecem os mesmos da Portaria vigente.

O Ministério da Saúde é responsável pela homologação. Entretanto, isso ainda não aconteceu. Assim, desde a Emenda Constitucional do Teto dos Gastos Públicos, o investimento nas políticas de saúde foi congelado.

Nota da ANTRA – Associação Nacional de Travestis e Transexuais: O Ministério da Saúde ainda não homologou a CID-11 ou atualizou os protocolos previstos na portaria do Processo de Transição, assim como ainda não homologou a resolução do CFM (mencionada ao longo do texto) que traz atualizações sobre o atendimento de saúde a população trans. Portanto, em uma nítida violação dos direitos trans e recomendações/normas previstas pela própria OMS.

Estamos trabalhando para mudar essa realidade, mas é provável que sigamos vendo exigências de laudos ou enquadramentos equivocados pelo CID-10.

Desta forma, seguiremos na luta pela despatologização das identidades Trans, e o contra o ato médico sobre nossos corpos. Sempre em busca da garantia do respeito a autonomia do sujeito, sua autodeterminação e o acesso à saúde sem um viés biologizante ou genitalista.

Como foi a transição social de minha filha

Você vai ter de esperar mais um pouco. Na verdade, vamos falar disso em nosso próximo post. Ou seja, até amanhã! Assim, estou compartilhando essas vivências pois creio que a discriminação vem da falta de informação. Desse modo, resolvi fazer a minha parte. Faço isso, desde 2015. Acredito na força da Diversidade & Inclusão. Ontem, aliás, terminei a primeira fase de um curso na Academia Itaú de Criadores, em parceria com a Youpix. Isso, porque informar é uma responsabilidade imensa. E agora, o Mundo Autista está selecionando parceiro que, como nós, acredita numa sociedade mais diversa, digna, democrática e humanizada. Bora?

Nós acreditamos na Diversidade e Inclusão
@itau #FeitoComCriadores

Selma Sueli Silva é graduada em Jornalismo e Relações Públicas pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, além de Especialista em Comunicação e Gestão Empresarial. Atuou, como produtora e apresentadora, nas rádios Itatiaia (de 2001 a 2015), Inconfidência, Autêntica Educativa e Super. Foi assessora chefe do INSS/MG, de 1993 a 2001. É autora de cinco livros. Foi diagnosticada com TEA (Transtorno do Espectro Autista) em 2016. Mantém o site “O Mundo Autista” no Portal UAI e o canal do YouTube “Mundo Autista” desde 2015.

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