Sophia Mendonça e Raquel Romano
Na vida, em várias ocasiões nos sentimos vítimas das situações. No entanto, para ser autor da própria história é preciso mudar esse tipo de pensamento. Abandonar o vitimismo para a descoberta de que a felicidade é, sim, uma escolha.
Sophia Mendonça: Quando você toma uma decisão, independente de qual seja a decisão, você recebe muitas críticas. Sempre haverá críticas. Haverá opiniões contrárias, haverá até mesmo muita ignorância e temos que estar preparados para este tipo de coisa. Daí a importância da paz interior. Como é importante ter o nosso equilíbrio, a nossa paz, para que a gente não ceda a distrações que nos tiram desse centro, dessa paz. Eu, por exemplo, sofri muitos ataques como autista e, agora, como mulher trans. Eu tenho um histórico de vida que poderia, se eu quisesse, elencar problemas e dificuldades e argumentações bem profundas sobre o porquê de ser infeliz. Afinal, se eu buscar uma justificativa para a infelicidade, eu vou encontrar uma argumentação bem sólida para tal. Só que eu não escolhi esse caminho. Eu escolhi poder transformar isso, porque se você fica nesse ciclo de lamentações, e a lamentação apaga a boa sorte, você acaba não percebendo a possibilidade de escolha, de você se lançar a outro objetivo, de você procurar a paz. Se você coloca essa responsabilidade da sua paz no outro, você acaba sofrendo muito mais. O que você acha disso, Raquel?
Raquel Romano: O que você disse me leva a uma reflexão sobre ser vítima. Você poderia ser uma vítima. Eu poderia ser uma vítima da vida. Porque, realmente, como você disse, eu poderia elencar N motivos para a minha angústia, a minha infelicidade, mas eu me recuso, porque eu sou uma vencedora, eu não sou vítima de nada.
Então, em primeiro lugar, eu preciso cuidar de mim para eu aprender a cuidar do outro. Nós, que lidamos com pessoas, nós precisamos nos cuidar diariamente, estarmos atentos ao nosso processo de paz interior. Não é fazer isso com um foco sacrifício “Olha! Cuidado! Vigia”. Não! Isso é tão natural, mas tão natural que, às vezes, fatos muito sutis na vida vem me mostrar o quanto eu consigo manter essa paz interior e enxergar o outro lado da moeda. “Eu não sou vítima de nada, porque ninguém tem culpa do que acontece comigo”. Eu sou a protagonista da minha história, a diretora do meu filme. Então, eu faço da minha história uma grande poesia ou uma grande tragédia. Eu escolho fazer uma grande poesia, incluindo personagens maravilhosos a quem devo muita gratidão e é isso que faz da nossa história uma história que remete à nossa paz interior. Gratidão por tudo que ocorreu, por tantos fatos e que, hoje, eu sou um resultado muito positivo de uma história.
Sophia Mendonça: E podemos mudar para ser uma pessoa melhor. E quando eu falo de protagonismo, eu não falo não de ter ninguém em volta, em não ter uma rede de apoio ao nosso redor. Por exemplo, uma pessoa com depressão profunda, ela vai precisar de um tratamento, de toda uma questão médica. Mas, ela pode transformar qualquer situação, a partir do momento em que ela se enxerga, que ela busca enxergar a si, com mais clareza, ela pode se transformar em qualquer situação.
Raquel Romano: Isso! Enxergar esse poder interior.
Sophia Mendonça: E isso não depende de fatores externos.
Raquel Romano: O que você disse é de muita sabedoria, porque cada fato que ocorre, se eu for buscar uma justificativa negativa para ele, eu vou me afundando cada vez mais. Então, cada vez que vem um desafio, nós devemos até agradecer, porque é mais um obstáculo para a gente aprende a vencer. É oportunidade que as pessoas têm quando chegam obstáculos na sua vida, de se fortalecerem, e nada de lamentação, como você disse. A lamentação, ela paralisa a pessoa, enfraquece. deixa a pessoa impotente e não é só a questão emocional e a saúde também. Você começa a enxergar as doenças, o corpo vai ficando frágil, claro, nós somos um sistema. E esse sistema precisa estar todo harmonioso. Assim, a gente sai do ciclo vicioso e entra em um ciclo virtuoso
. Na verdade não é um ciclo, é uma espiral virtuosa, que está sempre em crescimento.Sophia Mendonça: Toda vez que aparece uma situação difícil ou delicada, que gera algum sofrimento, a gente tende a cair naquele pensamento comum: “Ah, por que comigo? Por que não ganhei na loteria várias vezes?”. Aí não, a gente pensa assim: essa situação vai me fortalecer ou vai me paralisar? Eu escolho que ela me fortaleça.
Raquel Romano: São escolhas, exatamente. Aí, voltamos lá na história anterior: eu preciso me conhecer diariamente. Inclusive, meu próprio corpo me diz isso: qualquer prazer ou incômodo corporal, tudo isso é um sinal de como eu estou me relacionando com a vida. Então, nós temos que escutar o nosso corpo também, ele nos diz muito. Nada acontece por acaso. Uma gripe, uma dor aqui ou ali, temos de olhar. Como é que está o panorama da minha história? Como estou assimilando certas questões?. Eu preciso aprender a racionalizar muitas coisas. A razão nos ajuda muito a enxergar com clareza. E é um processo natural. O processo de vida é um desafio. Mas é lindo você ter a liberdade de escolha e saber usar desta liberdade. Isto é maravilhoso. A liberdade que nós temos, você vê muitas pessoas dizendo: “Ah, eu não posso fazer isso, o que as pessoas vão pensar de mim? Ah, eu não posso fazer isso , porque fulano não deixa”. Sabe, é tudo do imaginário. Uma pessoa adulta, ninguém te amarrou para você não fazer isso ou aquilo. Enfrente! Se você tem convicção de que não está prejudicando ninguém, de que aquilo é o caminho para a sua felicidade, vá em frente sem ter medo de ser perda de tempo, sem autossabotagem, que eu acho que essa é a pior arma que as pessoas têm contra elas mesmas. Quando a gente se conhece, a gente percebe quando está se autossabotando.
Sophia Mendonça: São as armadilhas do nosso cérebro, que a gente mesmo cria. Para a gente ter paz, a gente tem que buscar, primeiro, entender que a paz não é alguém que vai nos dar. O mundo é muito complicado e a vida é o próprio processo, e nós podemos encontrar essa paz dentro da gente e se tornar forte dentro de cada situação.
Raquel Romano: Exatamente. Essa paz que você encontra dentro da si está nesse processo de autoconhecimento, está em uma forma de alimentar a fé, que também é muito importante, quando você tem uma linha espiritual do seu crescimento, para a sua sustentação.
Sophia Mendonça: Neste caso, o budismo me ajuda bastante.
Raquel Romano: Exatamente. Eu recito os mantras, me fortaleço e entendendo que a fé não é algo cego, que eu faço pedidos a algo externo. Essa fé está dentro de mim, é uma força interior, que eu alimento diariamente.
Sophia Mendonça: E se polir diariamente, porque a vida é o próprio processo de viver.
Raquel Romano: Não descuidemos para que essa paz seja perene todos os dias.
Se você gosta do nosso trabalho e quiser ser um apoiador, clique no link e receba conteúdos exclusivos: https://www.catarse.me/pt/o_mundo_autista
Site: https://omundoautista.uai.com.br/
Instagram: https://www.instagram.com/mundo.autista/
Facebook: https://www.facebook.com/mundoautista…
Twitter: https://twitter.com/autista_mundo
Acessibilidades para uma explosão sensorial no autismo e o Transtorno do Processamento Sensorial (TPS) são…
Sophia Mendonça e o Budismo: “Buda é aquele que consegue suportar” e mesmo o inferno…
Crítica de cinema sem lacração, Sophia Mendonça lança newsletter no Substack. De volta às raízes,…
Conto infantil é metáfora para o autismo? Youtuber e escritora Sophia Mendonça lança contação de…
Nunca Fui Beijada é bom? Drew Barrymore é a alma cintilante de clássico das comédias…
Pensamento lógico e o autismo. O que isso significa? Tenho considerado o peso da ponderação…