Victor Mendonça e Raquel Romano
Escolher uma profissão é uma etapa muito delicada na vida de um jovem. É possível equilibrar prazer com a futura profissão?
Victor Mendonça: Hoje vamos falar sobre a fase final do ensino médio, quando a pessoa tem que escolher uma profissão. Como se dá isso, Raquel?
Raquel Romano: Para muitos, isso é tranquilo. Porém, para a maioria dos jovens não é tão simples porque há um leque enorme de opções. Eu acho que os jovens, ainda adolescentes, saem do colégio sem a maturidade necessária para escolher uma profissão. E isso gera muita angústia. Esses jovens não sabem o que querem e os pais tentam direcionar a escolha, mas a influência da família nem sempre é confortável para esses jovens. Eu tenho falado muito com os que me procuram para fazer um teste de aptidão e, ao mesmo tempo, observar o que eles gostam, desde criança.
Às vezes, você traz uma preferência por uma brincadeira, que vira uma brincadeira séria, como nós falamos e pode virar até uma profissão. Alguns pais que percebem que o filho tem uma tendência para a comunicação, para escrever, para publicidade esses pais, muitas vezes, invalidam essa aptidão falando que a profissão não é rentável, incentivando-os a seguir profissões como medicina ou engenharia. Essa atitude é complicadíssima, porque esse jovem pode sim ganhar dinheiro e ser feliz, o que é o mais importante, se realizando em qualquer profissão.
Imagina, minha primeira formação foi em artes, supostamente um lazer para quem for trabalhar com arte, mas eu nunca deixei essa minha profissão. Eu fui me aprimorando, fazendo muitos cursos, muitas especializações e o mestrado. Não existe essa profissão que traga a certeza que será lucrativa ou não. O mais importante é a pessoa fazer o que ela gosta para ser produtiva por meio do prazer de realizar, de pesquisar, de crescer naquilo.
Victor Mendonça: Verdade, e de certa forma isso dialoga muito com a minha própria experiência. Quando eu estava no ensino médio, eu tinha fobia social, achava que eu não poderia estar no ensino médio e na faculdade, nem pensar. Eu entrei na faculdade com 18 anos, fiz jornalismo porque eu gostava de acompanhar as notícias, temas de interesse e queria me desafiar, também, na comunicação. Agora estou no mestrado e eu nunca pensei nisso, mas as coisas foram acontecendo. Não é porque hoje em dia você entrou em uma profissão que você precisa parar naquilo. Você pode desenvolver, abrir o leque da sabedoria, do conhecimento que esta profissão trouxer e, a partir disso, você ampliando as possibilidades de atuação. Eu comecei como crítico de cinema, ainda na adolescência. Depois, eu passei a escritor, em seguida, jornalista em um ambiente muito mais acadêmico, de comunicação, sem abandonar o que eu estava fazendo lá atrás. Abandonar também não tem problema: hoje as pessoas vivem mais e essa longevidade, às vezes, nos proporciona a possibilidade de ter mais de uma profissão. Eu estou muito satisfeito como jornalista, escritor e quase professor, porque eu faço estágio docente.
Raquel Romano: Com certeza, Victor. A sua carreira acadêmica já está traçada. Com o potencial que você tem, você poderá ser um excelente professor. Disso, eu não tenho a menor dúvida. E nunca deixará de ser esse escritor, crítico de cinema, e o mais importante, quanto diálogo a sua profissão pode ter com outras áreas. As profissões podem sim, dialogar. Você não precisa estar aprisionado. É preciso ter a informação e desenvolver a criatividade naquilo que você escolheu. Mas não é nenhum drama não, eu vejo muitos jovens mudando também de área. Os meninos estão entrando muito cedo para a universidade e há um tempo para perceber.
Desistir não é perda de tempo. Isso aí também é um conceito muito, muito convencional, sabe? Muito engessado. “Ah, mas você entrou agora para a faculdade tal, vai mudar para esse curso ?”Victor Mendonça: É experiência válida, e ajuda a ser melhor no próximo.
Raquel Romano: Sim, e não é perda de tempo. Você pode mudar de profissão. O que é um ano em uma vida? O que é um semestre em uma vida? Dois anos em uma vida de realização, uma vida feliz. O jovem pode ter mais maturidade, mais percepção, mais segurança naquilo que ele conheceu para fazer essa mudança. Então, é tranquilo, eu não vejo nenhum drama. Agora, vejo ainda muita família insistir em impor o que pensa. Essas famílias invalidam certas profissões. Mas nós estamos em um mundo hoje, que eu nem sei a quantidade de profissões que existem, é uma infinidade. E você achar que só meia dúzia é que tem status? Isso é um pensamento muito antigo, muito arcaico. Os jovens hoje estão sabendo das coisas, podem se impor, dialogar com as famílias, “Pai, descobri isso aqui, é uma coisa que eu gosto, vou buscar uma profissão que tenha a ver com esse meu interesse.” É mais simples.
Victor Mendonça: A gente complica demais. A vida é mais simples do que possa parecer.
Raquel Romano: São os padrões condicionados que fazem esse engessamento.
Victor Mendonça: Quando você falou sobre mudança de curso, mudar de profissão, você me lembrou sobre uma amiga, a Francynne Perácio. Ela começou a fazer arquitetura, largou e foi para o jornalismo que, em tese, não dá o mesmo status. Ela veio para o jornalismo uns dois ou três anos mais velha do que eu. Então, ela já tinha uma maturidade, já era uma excelente aluna, aprendia com dedicação, com gosto. Por isso, não é perda de tempo, como você disse. Hoje, Francynne é uma repórter da Globo, conceituada na região onde ela trabalha.
Raquel Romano: Pois é. Quem disse que ela seria uma arquiteta feliz?
Victor Mendonça: Com o trabalho dela, ela é feliz e ainda contribui com a sociedade. Ela é uma jornalista diferenciada. Eu via isso desde a faculdade. Ela é um ponto fora da curva. E todos nós podemos ser um ponto fora da curva se a gente desenvolvernosso potencial latente.
Raquel Romano: Se a gente se permitir ser quem a gente é na essência, sair daqueles condicionamentos que nos formaram o tempo todo, faremos boas escolhas. Isso é para a vida inteira. A pandemia está aí nos mostrando quem somos. E é muito lindo isso: você poder descobrir novos desejos, se reinventar. Isso que é liberdade de ser.
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