A importância do modelo social da deficiência e da neurodiversidade no Ministério da Saúde é tema da coluna de Sophia Mendonça.
Fiquei muito feliz hoje ao ver um vídeo em defesa da Neurodiversidade nas redes do Ministério da Saúde, que trazia o pesquisador Lawrence Fung e o ativista autista, e estudante de medicina, Arthur Athayde. Assim, eles falam sobre a desinformação que reina sobre o autismo na saúde no Brasil e em outros países. Segundo Fung, a condição é melhor aplicada pelo modelo médico do que pelo social. Daí, ele aborda a importância de se valorizar o talento das pessoas autistas e dar-lhes o suporte necessário sem a necessidade de consertá-las.
Deputada Estadual Andréa Werner (PSB/SP) crítica ativismo de autistas
Daí, a deputada estadual Andréa Werner (PSB/SP) contra argumentou com base no recorte específico de mães de autistas grau 3 de suporte. Ela escreveu: “Desenvolver estratégias pra que uma criança autista não se machuque batendo a cabeça na parede é tentar conserta-la? Usar terapias combinadas pra uma criança autista que só come arroz melhorar sua seletividade alimentar é tentar conserta-la? Qual o conceito de acomodações e suporte e o de “consertar”? Autismo é neurodiversidade, mas também é deficiência. O MS precisa visitar famílias de autistas grau 3 adultos de baixa renda, que nunca tiveram nenhum tipo de intervenção e vivem fechados em casa, pra entender a gravidade da situação atual. Escutem mulheres autistas que são mães e ativistas! Escutem as famílias!”.
O interessante é que essas famílias, principalmente as pertencentes às elites, sempre tiveram o controle dessa narrativa em solo brasileiro. Por outro lado, é interessante como a presença de um estudante de medicina autista parece incomodar. Na verdade, a impressão que se tem é que, para muitas pessoas, autistas não podem ser bem-sucedidos. Nessa perspectiva, bons são aqueles em crise. Talvez porque a emoção de um meltdown diminui a credibilidade das pessoas com TEA e é algo fácil de acontecer em debates acalorados de Internet.
Por que um autista notável em sua área de atuação incomoda tanto?
Por essas e outras, eu também deixei meu comentário no post: “É incrível como um médico autista (ou estudante de medicina) desafia o status quo de muita gente que sempre controlou nossos corpos e se beneficiou disso para fins inclusive pessoais. O incômodo de alguns comentários é a maior prova disso. Entendo que há várias nuances e possibilidades de distorção da informação. Mas, os autistas de fato não precisam de conserto. Cabe à capacidade interpretativa de cada um e à abertura ao diálogo para a construção de um Brasil mais democratico e inclusivo”.
A educadora negra e autista Luciana Viegas, do Movimento Vidas Negras com Deficiência Importam, também deixou sua posição: “Que importante lembrar o que de fato importa: celebrar a neurodiversidade sempre lembrando que independente do nível de suporte há múltiplos caminhos para o desenvolvimento da pessoa autista. O padrão não é e nem pode ser a correção e sim a adequação e devido suporte às pessoas autistas em seus diversos espectros.”
A importância do modelo social da deficiência e da neurodiversidade no Ministério da Saúde
Enfim, tanto o modelo social quanto o modelo médico tem suas potências e limitações. Afinal, enquanto o segundo se enfoca nos contextos humanos e culturais em que vivemos, o segundo tende a focar nas limitações e dificuldades quase como algo isolado, sem se abrir a outras possibilidades de interpretação. Porém, a ideia do autismo como uma condição quase que exclusiva dos estudos biologicistas tem que acabar. Daí, a importância da postagem ao trazer uma perspectiva que muitos ainda tentam silenciar. Acredito na ética científica, na ciência em prol das pessoas e do diálogo entre vários lugares de fala.
Vídeo
Sophia Mendonça é jornalista e escritora. Também, atua como youtuber do canal “Mundo Autista” e é colunista da “Revista Autismo/Canal Autismo“ e do “Portal UAI“. Além disso, é mestre em Comunicação, Territorialidades e Vulnerabilidades (UFMG) e doutoranda em Literatura, Cultura e Tradução (UfPel). Assim, em 2016, tornou-se a pessoa mais jovem a receber o Grande Colar do Mérito em Belo Horizonte. Já em 2019, ganhou o prêmio de Boas Práticas do programa da União Européia Erasmus+.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.