Como mulher autista adulta, produtora de conteúdo e pesquisadora, tenho refletido bastante sobre um ponto de vista que me chamou a atenção. Trata-se da ideia de que os movimentos para “despatologizar” o autismo seriam uma “reação negativa” aos diagnósticos médicos. Mas será que essa afirmação realmente faz sentido?
Para muitos de nós, autistas, o diagnóstico é, sim, libertador! Afinal, ele traz uma compreensão necessária sobre nós mesmos, alívio por finalmente entender certas características. Além de abrir portas para o suporte e a acessibilidade que são fundamentais para nossa qualidade de vida. No entanto, é importante esclarecer que o movimento de despatologização não busca negar a existência do autismo. Nem tampouco a importância de um diagnóstico bem feito. Pelo contrário, sua essência reside em ressignificar a forma como se percebe as pessoas autistas. Ou seja, como tratam essas pessoas e como as integram na sociedade.
Além da Lista de Déficits: O Que a Despatologização Realmente Propõe
Nossa crítica se direciona à visão que, por vezes, reduz o autismo a uma simples lista de “déficits” a serem corrigidos. Sim, as características autistas são parte intrínseca da nossa neurobiologia. E é claro, elas trazem consequências para nossa vida. Porém, muitas das dificuldades que enfrentamos não nascem apenas de nossas particularidades, mas de uma sociedade que, em grande parte, não foi projetada para nos incluir.
Então, a ciência deveria ser uma aliada poderosa na busca por mais suporte e acessibilidade. Isso quer dizer que ela deveria nos ajudar a compreender as especificidades do funcionamento autista para, assim, construir ambientes verdadeiramente inclusivos. Infelizmente, observamos que, em muitos casos, o diagnóstico se tornou um rótulo. Portanto, virou uma ferramenta que, ao invés de abrir caminhos, acaba por segregar.
Por Um Novo Paradigma: Ciência a Serviço da Inclusão
O que propomos, de fato, é uma mudança de paradigma. Ou seja, queremos que a ciência nos ajude a entender a rica diversidade das variações neurobiológicas e, a partir desse conhecimento, a desenvolver o suporte e a acessibilidade necessários para todas as pessoas neurodivergentes. Então, não se trata de negar os desafios inerentes ao autismo. Pelo contrário, trata-se de reconhecer que esses desafios muitas vezes surgem e se intensificam por meio de interações com um ambiente inadequado e pela falta de compreensão social.
Despatologizar o autismo, em minha visão, não é um erro. Ńa verdade, trata-se um passo essencial para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva, onde a ciência atua como um pilar para a promoção da dignidade e autonomia de todas as pessoas. Então, é sobre buscar um futuro onde ser autista não seja visto como um problema a ser corrigido, mas sim como uma das muitas, e valiosas, formas de ser humano.
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Sophia Mendonça é jornalista, professora universitária e escritora. Além disso, é mestre em Comunicação, Territorialidades e Vulnerabilidades (UFMG) e doutoranda em Literatura, Cultura e Tradução (UfPel). Ela também ministrou aulas de “Tópicos em Produção de Texto: Crítica de Cinema “na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), junto ao professor Nísio Teixeira. Além disso, Sophia dá aulas de “Literatura Brasileira Contemporânea “na Universidade Federal de Pelotas (UfPel), com ênfase em neurodiversidade e questões de gênero.
Atualmente, Sophia é youtuber do canal “Mundo Autista”, crítica de cinema no “Portal UAI” e repórter da “Revista Autismo“. Aliás, ela atua como criadora de conteúdo desde 2009, quando estreou como crítica de cinema, colaborando com o site Cineplayers!. Também, é formada nos cursos “Teoria, Linguagem e Crítica Cinematográfica” (2020) e “A Arte do FIlme” (2018), do professor Pablo Villaça.
** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.